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24 de fev. de 2012

Do Custo da Folha de Pagamento

O custo com encargos trabalhistas é particularmente alto, onerando principalmente as empresas intensivas em mão de obra (quando deveria ser o contrário, para se priorizar a geração de empregos).
Costuma-se dizer que, para cada R$ 1,00 que a empresa paga de salário, outro R$ 1,00 é gasto com o pagamento de encargos trabalhistas. Esse número, porém, não é preciso. Depende do tipo de empresa, do sistema de tributação, do investimento necessário com contratação e formação, etc.
Exemplificando, uma empresa tributada pelo Lucro Real ou Presumido, teria como encargos trabalhistas, sobre o valor do salário: 20% de INSS (contribuição patronal), 8% de FGTS, de 1% a 3% de seguro de acidente de trabalho, 2,5% de salário educação e 20% corresponderia ao descanso semanal remunerado (considerando 4 domingos e 4 sábados com meio período de trabalho por mês - semana de 44 horas). Mais ainda, 8,33% corresponderia ao 13º salário e 3,3% iriam para o famigerado "Sistema S" (Sebrae, Sesi, Sesc, etc.). Por fim, 11,11% seria o correspondente às férias, levando em conta um salário por ano mais 1/3 de abono quando de seu usufruto.
Levando tudo isso em conta, facilmente chegaríamos a 87% de encargos sobre o valor do salário. Mas ainda seria necessário considerar o custo das rescisões (com aviso prévio e multa de 40% sobre o saldo na conta do FGTS) com base na média de rotatividade da empresa ou setor.
E se levarmos em conta, ainda, que, mesmo para funções simples, é necessário um certo investimento, um período de adaptação, na contratação de novos funcionários, facilmente constataremos que não há nada de absurdo em considerar que, para cada R$ 1,00 que a empresa paga de salário, outro R$ 1,00 corresponderia a encargos trabalhistas. E isso mesmo que se questione o critério que utilizei acima, podendo ser considerado que o descanso semanal remunerado já integraria o salário, embora não se constitua de período efetivamente trabalhado.
Porém, não considerei no cálculo acima o "Custo Brasil" que seria representado pela Justiça do Trabalho, onde abundam decisões sem respaldo legal e majoritariamente contra os empregadores, como se o empreendedorismo fosse um mal a ser extirpado, gerando insegurança jurídica e custos não previstos.
E, mais ainda, não foi considerado o custo de controle da mão de obra, com as exigências do Ministério do Trabalho, anotação e acompanhamento de controle de ponto, adequação e acompanhamento das normas de segurança no trabalho, o próprio cálculo da folha de pagamento e de rescisões, emissão de documentos, custos com uniformes, com alimentação, com transporte, enfim, o custo de empregar é geralmente muito mais alto do que aquele percebido pelo empregado e imaginado pelo empregador (não estou defendendo que normas de controle e segurança não deveriam existir, apenas enfatizando que são custosas).
Para empresas inscritas no sistema de tributação conhecido como Simples existe a grande vantagem de não incidência dos 20% de INSS de contribuição patronal. Também não incidiria o percentual do "Sistema S", nem o de seguro de acidente de trabalho, nem o do salário educação. Em termos gerais, se consideramos um percentual de 87% de encargos para empresa no Lucro Real e Presumido, para empresa no sistema Simples esse percentual cairia para 55%. Trata-se de um grande alívio, principalmente para atividades intensivas em mão de obra. O problema é que, dá-se de um lado e tira-se de outro, já que as empresas inscritas no Simples têm um limite máximo de faturamento muito restrito, que torna difícil arcar com os custos e controles laborais e administrativos.
Enfim, o objetivo aqui é simplesmente mostrar que a decisão de contratar é complexa, é de fato uma decisão estratégica, que precisa ser muito bem avaliada. Os custos envolvidos com mão de obra, se não houver respaldo em aumento de faturamento e produtividade, podem levar ao fim uma atividade empresarial, trazendo sérias consequências para seus sócios em caso de falta de recursos financeiros.

8 de fev. de 2012

Sazonalidade: um Problema Fundamental das Fábricas

Com o movimento de globalização econômica, verifica-se crescente concentração de empresas (fusões e aquisições), criando organizações cada vez maiores, que procuram atuar em mercados de vários países e evitar ao máximo a concorrência.
Um dos fatores que estão na origem desse movimento é a dificuldade em se manter uma posição com estabilidade de lucros ao longo do tempo, diante da sazonalidade de mercado.
A análise a seguir foi realizada com base em informações de fábricas de móveis, setor que se destaca pela sazonalidade de vendas e alto grau de competição. Esse cenário, que também serve como exemplo para avaliação de outros segmentos, indica que, diante da sazonalidade, em um momento ou outro, as fábricas estão destinadas ao fracasso.
Primeiramente vamos considerar o gráfico abaixo, que representa de forma simplificada o mercado no período de um ano. A linha escura representa a demanda para uma determinada empresa, onde se observam três picos de venda ao longo do ano (dia das mães, dia dos pais e período de natal) e um período de baixas vendas (o primeiro trimestre). A linha pontilhada representa a demanda média no ano, que seria o nível de mercado se não houvesse sazonalidade:


 Nessa situação, surgem os seguintes problemas:
Em primeiro lugar, a empresa não tem como atender totalmente a demanda nos momentos com pico de venda. Isso só seria possível se ela tivesse grande capacidade ociosa ou muito capital parado, que investiria na formação de um grande estoque nos meses de menor demanda. Para isso acontecer, precisaria de uma margem de lucro muito elevada, o que seria improvável em um mercado competitivo.
A alternativa seria a empresa procurar variar o seu custo fixo, para mantê-lo em acordo com a oscilação das vendas. Variar o custo fixo? Só a expressão já deixa claro o quanto isso é improvável, pois, se o custo é fixo, variável é que não é! A empresa não tem como abandonar seus controles administrativos, equipamentos, etc. E mesmo funcionários, uma vez dispensados, implicam em grande gasto com rescisões e, posteriormente, tempo de treinamento (investimento) com novos contratados. Ou seja, pelo menos ao longo do ano, não há como manter um custo fixo oscilante.
Diante disso, a empresa teria que determinar um nível de produção e procurar mantê-lo sem grandes variações. Vamos supor, considerando a mesma figura anterior, que ela escolha a linha tracejada (azul) no gráfico, que corresponde exatamente à média de vendas no ano.
Observamos que, mantendo essa média, a empresa não terá muito sucesso em atender os picos de demanda. E, se não fizer isso, vai ficar desprestigiada junto aos clientes, que irão procurar alternativas na concorrência e podem acabar mesmo boicotando as compras da empresa por esta não atender os pedidos de maneira consistente ao longo do ano.
Assim, a empresa se vê obrigada a adotar uma capacidade de produção acima da média. Vamos considerar, então, que ela adote a nova linha pontilhada, indicada no gráfico abaixo:


Mesmo nesse novo nível de produção, mais alto, a empresa não consegue atender toda a demanda nos períodos de pico de vendas, apenas faz "menos feio", inclusive para não sofrer maiores revezes nos períodos de baixa (diante da indisposição dos clientes por não terem todos os pedidos atendidos nos períodos de maior demanda). E isso sem falar nas influências externas que podem afetar o mercado (taxa de juros, concentração no mercado lojista, influência de novos produtos, queda na atividade econômica, incerteza dos clientes em programarem compras, falta de mão de obra qualificada, etc.), bem como nas influências internas (problemas de qualidade, atraso na entrega, baixa produtividade, etc.).
Porém, ao procurar atender melhor o mercado, a empresa incorre em um novo problema. Vamos adicionar uma nova linha exemplificativa no gráfico, que representaria seu ponto de equilíbrio (linha azul não pontilhada):



Ao aumentar sua capacidade de produção para atender melhor nos períodos de pico de venda, naturalmente a empresa aumenta também seu ponto de equilíbrio. Com isso, ela atende melhor o mercado nos períodos de maiores vendas e, se tudo der certo, consegue um bom lucro. Porém, fica mais difícil conseguir lucro nos períodos de baixa demanda, até porque há muitas variáveis nesse período que estão além do controle da empresa (expectativas dos clientes e consumidores, produtos novos ou alternativos, inadimplência, taxa de juros, promoções na concorrência, concentração no varejo, etc.).
Desta forma, nos períodos de maior venda a empresa consegue lucro, embora não atendendo toda demanda possível (dada sua limitação de capacidade produtiva), se nada der errado. A expectativa de lucro seria a área indicada em amarelo no gráfico abaixo (diferença entre vendas realizadas e linha de ponto de equilíbrio):


Porém, enquanto o lucro é incerto, devido à influência de vários fatores externos e eventuais dificuldades internas, o prejuízo é certo. Ao aumentar o seu ponto de equilíbrio para atender os períodos de maior demanda, a empresa também aumentou sua expectativa de prejuízo nos períodos de queda nas vendas. No gráfico abaixo, destaca-se em vermelho os períodos em que a empresa teria prejuízo certo (diferença entre a linha do ponto de equilíbrio e vendas realizadas):


Assim, quem garante que o lucro dos períodos de maior venda será suficiente para suportar os períodos de resultado negativo? A empresa teria que acumular recursos para passar o período ruim sem prejudicar sua capacidade para os períodos de maior demanda.
Inevitavelmente, nos períodos de baixas vendas, ocorrem algumas rescisões de funcionários e maior concessão de férias, o que requer dinheiro. Mas se o fluxo de caixa do período de boas vendas não for suficiente (afinal, não basta ter lucro, tem que receber do cliente o que foi vendido), cria-se um rombo, pois as obrigações tem que ser pagas. E aí a empresa começa a ficar com falta de capital de giro, começa a depender de bancos, ter que pagar juros, seu prejuízo tende a aumentar ou sua lucratividade fica comprometida, enfim... O que se vê é que é muito frágil a manutenção de uma situação de lucratividade diante da sazonalidade de mercado. Além de ser difícil para a empresa manter uma situação de equilíbrio e se adequar à necessidade do mercado, qualquer fator negativo inesperado implicará no comprometimento de toda a operação.
Como, então, resolver esse dilema? Desistir de manter a fábrica?
Certa vez assisti aula de um doutor em direito empresarial que relatou o seguinte caso: um amigo dele havia obtido recursos e lhe procurou pedindo orientação sobre como abrir um negócio. Esse professor respondeu que, se o amigo fizesse isso, iria chamar a esposa dele para interná-lo. Afinal, é muito mais seguro aplicar dinheiro no mercado financeiro, em títulos do governo, do que investir em atividade empresarial, principalmente diante do Fisco e da Justiça do Trabalho - que desrespeitam a lei para executar quem é ou foi empresário/ sócio, de qualquer jeito.
Concordo plenamente com esse conselho para o caso de quem pensa em começar uma nova empresa. O Brasil não é um porto seguro para a atividade de empreendedorismo, embora tenha grande potencial para tal. Mas, para quem já tem uma empresa, que já está atuando no mercado com pelo menos algum conhecimento, acho que a melhor saída é procurar adequar a situação a essa realidade de tantos problemas e incertezas. Afinal, encontrar comprador para empresa também não é nada simples.
Por isso, quem atua como empresário deve fazer um planejamento patrimonial, o que inclui evitar ao máximo que bens fiquem apenas em nome dos sócios. Infelizmente é a essa a situação que os empreendedores acabam sendo levados pela realidade atual do país.
Mas isso não basta. Como resolver o problema da lucratividade e, por extensão, do fluxo de caixa? Afinal, uma empresa lucrativa, que gere caixa, é a maior proteção ao patrimônio pessoal dos sócios.
O ideal seria procurar uma posição de monopólio ou oligopólio. É isso que garante o sucesso de muitas empresas. Só que isso é muito difícil de conseguir e costuma ser algo momentâneo, que chegará ao fim um dia ou outro.
O que resta, então, são dois caminhos. Primeiro, diversificar o negócio, procurando atuar em setores diferentes, que não tenham a mesma sazonalidade de mercado. Segundo, e talvez mais importante, avaliar a possibilidade de, ao invés de buscar uma participação de mercado maior, com faturamento alto, ter uma participação menor, mas com produtos de maior rentabilidade. Misturar os dois, buscando atuar em seguimentos diferentes (que podem ser pequenos), com boa rentabilidade, parece que seria a solução ideal (ou única saída).
Por fim, não é de surpreender que muitos empresários sonham em ter sucesso para, assim, venderem suas empresas para empresas maiores.