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9 de nov. de 2012

Algo Sobre a Cultura Laboral no Japão


Após a II Guerra Mundial, por pressão da força de ocupação americana, foram instituídas leis trabalhistas rígidas no Japão dificultando a demissão de funcionários e estabelecendo o emprego vitalício (prática já conhecida na sociedade japonesa desde o início de sua industrialização). O objetivo das medidas era reduzir ao máximo o desemprego, evitando maior caos social no processo de reconstrução do país (e, talvez, também melhorar a imagem dos americanos frente à população).


Contudo, é necessário frisar que o sistema japonês de evolução salarial por senioridade (trabalhador mais antigo, em mesma função, recebe mais que trabalhador mais recentemente contratado), o incentivo à resolução de problemas em equipe (os outrora famosos "Círculos de Controle de Qualidade") e o papel ativo da companhia na vida social do indivíduo, não constituem necessariamente um sistema harmônico. Antes, o Japão é caracterizado, em comparação com os ideais do ocidente, como uma sociedade rígida e hierarquizada, limitadora das aptidões individuais, repulsiva à iniciativa e criatividade e discriminatória em relação às mulheres e estrangeiros.
(...) As pressões de uma sociedade que enfatiza a harmonia acima de tudo podem pesar seriamente sobre indivíduos isolados, especialmente sobre os talentosos (...) No caso do Japão, a maior parte dos danos permanece invisível. Há perda de criatividade, sufocamento dos sentimentos da pessoa, o tributo pago às mediocridades altamente colocadas, a brecha que às vezes se abre sinistramente entre o que os japoneses chamam de tatemae, ou aparência desejada das coisas, e as honne, as condições reais, o pensamento real, os motivos que cada um realmente tem. Vivendo e trabalhando no Japão, o indivíduo se sente às vezes como um ator num drama estilizado Kabuki, encenando dentro de uma estufa. No fim, mesmo o estrangeiro, ainda que bem gradualmente, acaba por viver o papel. Não há maneira de escapar. (Gibney, 1982, p. 28)
Em relação ao emprego vitalício, sua prática é contestável, nunca chegando a ser totalmente difundida entre as empresas e regulamentada formalmente, sendo produto de consenso entre lealdade à empresa em troca de garantia de emprego.
Convém frisar, todavia, que somente uns 30% da força-de-trabalho japonesa – aqueles empregados nas grandes corporações – se beneficiam [do sistema de senioridade] (...) e 98% das empresas japonesas não oferecem "emprego por toda vida". (Rattner, 1987, p. 25)
Por outro lado, no Japão, a mudança de emprego é desestimulada. Primeiro porque a senioridade é contada a partir da data de entrada no emprego. Normalmente, quem sai de um trabalho e consegue emprego em outra empresa começa com o mais baixo salário. Segundo porque a prática de mudança de organização é socialmente mal vista, pois quem deixa um emprego é considerado como pessoa pouco confiável.
Não é de se esperar que dedicar toda a vida profissional a uma única organização seja suficiente para satisfazer as inspirações pessoais de determinada profissão, o que acaba tolhendo a criatividade e iniciativa individual, gerando indivíduos oprimidos e frustrados.
Em 1995, pela primeira vez, os japoneses questionados em uma pesquisa anual realizada pelo Ministério do Trabalho, declararam que a satisfação profissional era mais importante do que a lealdade à empresa (...) Trabalhadores de meio expediente e temporários já constituem  mais de um quarto da força de trabalho japonesa. (Micklethwait, Wooldridge, 1998, p. 157)
Também é questionável a informação que nas corporações japonesas, apesar de inseridas numa sociedade hierárquica e tradicional, as decisões sejam balizadas pelo consenso em grupo:
Quanto ao processo decisório baseado em consenso, na realidade, alguém toma a iniciativa e os outros endossam sua posição ou proposta. Embora considerem que todos participam do processo em pé de igualdade, de fato poucos ousariam manifestar uma opinião minoritária ou discordante. A necessidade de se preservar a harmonia do grupo leva indivíduos a ocultar sua “honne” ou sentimento verdadeiro, revelando apenas a máscara ou "tatemae”, alinhado com os outros. (Rattner, 1987, p. 27)
Assim, contrapõe-se a ideia arraigada que as práticas japonesas de gestão possam ser transplantadas para outras economias e que, por si só, explicariam o sucesso do país nas décadas de 1970 e 80.
Na verdade, devemos compreender esse modelo de relação de trabalho como fruto das características históricas e culturais próprias da sociedade japonesa, em sua adaptação ao sistema capitalista, do que como um paradigma para referência em administração (como se tentou fazer quando a economia japonesa estava no auge).
O modelo japonês, sem levar em consideração esses aspectos, somente resultaria em efetividade em alguns processos técnicos e operacionais, não sendo correto supor que suas técnicas de gestão sejam de fato mais evoluídas ou que possam ser absorvidas pelo ocidente sem necessário questionamento e adaptação.

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA:
GIBNEY, Frank. Milagre Bem Planejado. São Paulo: Record, 1982.
MICKLETHWALT, John, WOOLDRIDGE, Adrian. Os Bruxos da Administração. 3. ed. Rio de Janeiro: Campus, 1998.
RATTNER, Henrique. Política Industrial no Japão: tendências e perspectivas. 1987. 33 p. Texto de discussão 01/87, Faculdade de Economia e Administração, Universidade de São Paulo. 

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