O Código Tributário Nacional (lei n° 5.172/1966) indica
a responsabilidade de sócios-diretores e executivos pelos impostos em atraso
das empresas, desde que tenham atuado de forma irregular:
Art.
135. São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações
tributárias resultantes de atos
praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou
estatutos:
(...)
III - os diretores, gerentes ou representantes
de pessoas jurídicas de direito privado.
O problema é que a Fazenda Pública, diante de
situação de inadimplemento de pessoa jurídica, muitas vezes indica o nome de
sócios, de executivos, de ex-sócios, de ex-diretores etc., quando da
constituição de Certidão de Dívida Ativa.
E isso ocorre a despeito do entendimento do Superior
Tribunal de Justiça, que destaca em sua Súmula nº 430: "O inadimplemento
da obrigação tributária pela sociedade não gera, por si só, a responsabilidade
solidária do sócio-gerente."
Todavia, o Fisco inicia processo de execução fiscal contra
pessoas físicas, independentemente de ter ocorrido excesso de poderes ou
infração legal.
E, pior, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) não
repudia tal procedimento, diante da presunção de veracidade da Certidão de
Dívida Ativa (CDA), conforme art. 204 do CTN:
Art.
204. A dívida regularmente inscrita goza da presunção de certeza e liquidez e tem o efeito de prova
pré-constituída.
Parágrafo
único. A presunção a que se refere este artigo é relativa e pode ser ilidida
por prova inequívoca, a cargo do sujeito passivo ou do terceiro a que
aproveite.
Portanto, quem foi indicado na CDA, juntamente com a
pessoa jurídica devedora, que se defenda para provar que seu nome lá consta indevidamente.
O problema é que, para fazer tal prova, o suposto
devedor deve propor embargos à execução. Para tal, precisa apresentar garantias
para pagamento do débito - se ainda não teve seus bens penhorados em juízo.
Mais que isso: mesmo com a apresentação de embargos à
execução, o processo executório continua. O devedor precisa demonstrar a
relevância de seus argumentos e que a continuidade da execução lhe causaria
dano de difícil ou incerta reparação, para que o processo executório seja
suspenso até o julgamento dos embargos.
Ou seja, não importa se o Fisco agiu de forma legal
ou não, quem é indicado como devedor sofrerá as consequências de uma forma ou
de outra. E, se não tiver bens que possam garantir a execução, ficará com seu
nome registrado em dívida tributária sabe-se lá até quando.
Além disso, mesmo que garanta a execução, como fará
para provar que não praticou atos "com excesso de poderes ou infração de
lei, contrato social ou estatutos"? Como fazer prova negativa? Terá que
apresentar todos os registros contábeis do período relativo ao débito, todos os
contratos que assinou, enfim, relatar todas as decisões nas quais esteve
envolvido, para mostrar que não atuou de forma irregular? Tal procedimento é viável?
Correrá o risco de perder seus bens, mesmo se for indevidamente indicado na
Certidão de Dívida Ativa, mesmo não tendo cometido qualquer irregularidade, sem
mesmo ter culpa pela dívida da empresa.
Isso mostra que o Fisco e o STJ pressupõem que
empresários e executivos agem de má-fé e, uma vez acusados, devem provar sua
inocência - não cabendo a quem acusa (o Fisco) provar o que afirma.
Existe alternativa?
Por enquanto, a luz no fim do túnel parece ser
questionar, quando for o caso, a ausência de um processo administrativo que
fundamente a inclusão de responsáveis na Certidão de Dívida Ativa (CDA). Isso diante
do fato de, muitas vezes (para não dizer normalmente), o Fisco simplesmente
inclui o nome de terceiros na CDA, sem se preocupar com os requisitos legais. É
a estratégia do "se colar, colou", em detrimento da obrigação legal
que deve reger os atos das entidades públicas.
Nesse sentido, destaca-se a falta da administração
pública em observar, entre outros, o regramento do Código Tributário Nacional:
Art.
112. A lei tributária que define infrações, ou lhe comina penalidades, interpreta-se da maneira mais favorável
ao acusado, em caso de dúvida quanto:
(...)
III - à
autoria, imputabilidade, ou
punibilidade;
(...)
Art.
142. Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito
tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a
ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria
tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a
aplicação da penalidade cabível.
Parágrafo
único. A atividade administrativa de lançamento é vinculada e obrigatória, sob
pena de responsabilidade funcional.
E, também, da Constituição Federal:
Art. 5º
Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos
seguintes:
(...)
LIV - ninguém será privado da liberdade ou de
seus bens sem o devido processo legal;
LV -
aos litigantes, em processo judicial
ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa,
com os meios e recursos a ela inerentes;
Assim, a falta de fundamento para justificar a
inclusão inicial de terceiros na Certidão de Dívida Ativa (o que deve ser
verificado em processo administrativo), bem como a falta de notificação a todas
as partes, ensejaria o questionamento sobre a validade de constituição da
Certidão de Dívida Ativa, o que pode ser atacado com exceção de
pré-executividade (sem necessidade de garantir a execução com bens).
Resta esperar que esse entendimento tenha futuro no
judiciário, principalmente se o STJ não mudar seu posicionamento de assumir válida
a culpa presumida de empresários e executivos.
REFERÊNCIAS
CONSULTADAS:
BARCELOS, Soraya M. A Responsabilidade Tributária Dos
Sócios da Pessoa Jurídica em Execuções Fiscais. Revista Jus Navigandi, ano 15, n. 2674, out. 2010 . Disponível em:
<http://jus.com.br/artigos/17694>.
Acesso em: 16 nov. 2013.
BRASIL. Constituição da República Federativa do
Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>.
Acesso em: 16 nov. 2013.
BRASIL. Lei n° 5.172, de 25 de outubro de 1966
(Código Tributário Nacional). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5172.htm>.
Acesso em: 16 nov. 2013
BREYNER, Frederico M. Responsabilidade Tributária Dos
Sócios-Gerentes: Alegação de Ilegitimidade Passiva em Exceção de
Pré-executividade e a Aplicabilidade da Jurisprudência do STJ em Sede de
Recursos Repetitivos (REsp nos 1.104.900/ES e 1.110.925/SP). Revista Dialética de Direito Tributário,
v. 167, p. 55, 2009.
FERNANDES, Bernardo T. L. A Citação do Sócio na Execução
Fiscal. Revista Jus Navigandi, ano
18, n. 3689, ago. 2013. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/25113>.
Acesso em: 16 nov. 2013.