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21 de abr. de 2014

Competição e Atividade Empresarial

No curso de economia que fiz, em universidade pública, além da visão ideológica predominante, marxista-keynesiana, a única alternativa era estudar a chamada economia neoclássica, caracterizada por modelos matemáticos de equilíbrio distantes da realidade.
É justamente esse distanciamento da realidade, por parte dos modelos econômicos, que vem destacar o livro Competição e Atividade Empresarial, de Israel Meir Kirzner.


A tese principal do livro é que a análise econômica não deve focar numa situação ideal de equilíbrio, mas no dinamismo do mercado:
(...) A fim de compreender o funcionamento de uma economia de mercado, argumentamos, é necessário prestar atenção, não às condições exigidas para o equilíbrio de mercado, mas às mudanças sistemáticas que podemos esperar que sejam geradas num mercado onde essas condições não são satisfeitas. A ênfase posta no processo de mercado, e não no equilíbrio de mercado, possibilitou-nos perceber [que] o papel da atividade empresarial é reconhecer o caráter essencialmente competitivo do processo de mercado. Ao seguirmos essa linha de raciocínio, ganhamos um novo insight sobre uma série de características importantes do sistema de mercado. (p. 183)
Nesse sentido, a concepção de Kirzner se diferencia da de Schumpeter (autor que eu admirava no curso de economia), posto que este admite uma situação de equilíbrio que é abalada pela inovação (a "destruição criadora"), ao passo que Kirzner enfatiza a força do desequilíbrio, da busca de novas oportunidades, como motor do sistema capitalista.
(...) O empresário de Schumpeter age para perturbar uma situação de equilíbrio existente. A atividade empresarial rompe o fluxo circular contínuo. O empresário é descrito como iniciador de mudanças e como gerador de novas oportunidades. Embora cada explosão de inovação empresarial leve eventualmente a uma nova situação de equilíbrio, o empresário é apresentado como uma força desequilibradora, e não equilibradora. O desenvolvimento econômico, que Schumpeter, evidentemente, faz depender tremendamente da atividade empresarial, é “inteiramente estranho ao que pode ser observado na... tendência para o equilíbrio”. (p. 71)
Assim, Kirzer destaca, como aspecto fundamental em sua teoria, a concepção de processo de mercado:
Minha ênfase nessa diferença entre a discussão de Schumpeter e a minha sublinha a importância crucial da atividade empresarial no processo de mercado. Um tratamento como o de Schumpeter, que invoca a atividade empresarial como uma força exógena elevando a economia de um estado de equilíbrio (para eventualmente atingir outro estado igual como resultado da ação de “imitadores”), transmite provavelmente a impressão de que para atingir o equilíbrio, nenhum papel empresarial é, em princípio, necessário. Um tal tratamento, em outras palavras, provavelmente gerará a visão terrivelmente errada de que o estado de equilíbrio pode-se estabelecer a si mesmo, sem nenhum dispositivo social para aplicar e ordenar as informações dispersas que são a única origem de um tal estado. (pp. 71-72)
Dessa forma, podemos enfatizar a seguinte diferenciação: enquanto, para Schumpeter, a atividade empresarial é ligada à atividade inovativa, aos saltos tecnológicos, ao desenvolvimento, para Kirzner a atividade do empresário visa preencher os espaços, aproveitar as oportunidades econômicas que vão surgindo e que, assim, mantém o funcionamento do mercado, no atendimento à demanda por produtos.
(...) Para Schumpeter, a atividade empresarial é importante sobretudo por deslanchar o desenvolvimento econômico; para mim, ele é importante sobretudo por possibilitar que o processo de mercado funcione em todos os contextos — sendo a possibilidade de desenvolvimento econômico vista simplesmente como um caso especial. (p. 78)
A passagem a seguir destaca mais claramente essa diferença de visões, do empresário inovador, que causa uma situação de desquilíbrio num mercado inicialmente equilibrado (Schumpeter) e do empresário especulador, no bom sentido da palavra, que encontra uma situação de desquilíbrio, e a explora, atendendo uma demanda existente (Kirzner):
(...) para Schumpeter, a essência da atividade empresarial é a capacidade de afastar-se da rotina, de destruir estruturas existentes, de afastar o sistema do fluxo regular e circular do equilíbrio. Para nós, por outro lado, o elemento crucial na atividade empresarial é a capacidade de ver oportunidades inexploradas cuja existência prévia significava que a regularidade inicial do fluxo circular era ilusória — que, longe de estar em estado de equilíbrio, ela representava uma situação de desequilíbrio inevitavelmente destinada a ser perturbada. Para Schumpeter, o empresário é a força perturbadora e desequilibradora que tira o mercado da sonolência do equilíbrio; para nós, o empresário é a força equilibradora cuja atividade reage às tensões existentes e fornece as correções pelas quais as oportunidades inexploradas estão clamando. (p. 114)

REFERÊNCIAS CONSULTADAS:
KIRZNER, Israel M. Competição e Atividade Empresarial. 2° ed. São Paulo: Instituto Ludwig von Mises Brasil, 2012. Disponível em: http://www.mises.org.br/Ebook.aspx?id=67

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