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22 de jun. de 2014

Ativismo Judicial Trabalhista e a Multa do Art. 475-J do Código de Processo Civil

I. Introdução
As demandas sociais insatisfeitas, diante das contingências e crises do Estado, incentivam uma atuação mais ativa do poder judiciário (Hirschl, 2008).
Particularmente no Brasil, tal postura pode se mostrar reforçada pela pouca efetividade do poder legislativo e pelas limitações e má alocação de recursos por parte do poder executivo.
Embora tal contexto não implique em considerar que o poder judiciário esteja em melhores condições para servir a sociedade, o fato é que se verifica a tentativa do judiciário em suprir a omissão dos demais poderes, seja atuando na qualidade de verdadeiro legislador, seja determinando a alocação de recursos onde esses se mostrem insuficientes, no cumprimento dos objetivos indicados em âmbito constitucional.
Tal postura ativista não poderia deixar de ser observada no contexto da Justiça do Trabalho, que se caracteriza pelo posicionamento de proteção a uma das partes na relação de trabalho, assumida como hipossuficiente.
No entanto, cabe indagar, diante do objetivo protetivo da Justiça do Trabalho, quais seriam as consequências da ausência de limites na prática de ativismo judicial no âmbito trabalhista.
Assim, pretende-se avaliar, tomando por base uma questão controversa atual, se a postura ativista trabalhista extrapola os limites da legalidade e de atuação possível do poder judiciário.
A visão apresentada neste trabalho refuta a aplicação do art. 475-J do Código de Processo Civil (CPC) na execução trabalhista, diante do questionamento da falta de limites na postura de ativismo judicial, da insegurança jurídica e do desrespeito à Constituição Federal, que seriam consequências da admissibilidade do direito fundado na subjetividade, contribuindo para a reflexão sobre essa importante temática.
         
II. Do Ativismo Judicial
Diz-se ativismo judicial quando o juiz atua além do estabelecido em lei, quando passa a buscar soluções para problemas políticos aplicando critérios jurídicos (Reverbel, 2009).
Cabe ao magistrado decidir dentro dos limites estabelecidos pela legislação, o que não inibe uma margem de interpretação frente aos casos concretos que analisa. A partir do momento que o juiz desconsidera os limites estabelecidos pelo legislador, passando a agir de forma subjetiva, é verificado o ativismo judicial (Nunes, 2011).
Dessa forma, na prática de ativismo judicial, a Constituição é considerada como um remédio para todos os males, permitindo ao magistrado desenvolver argumentação jurídica para chegar a qualquer resultado, diante de princípios e cláusulas abertas (Trindade e Morais, 2011).
Barroso (2009) identifica a postura de ativismo judicial por meio de condutas como: (1) aplicação da Constituição em situações não contempladas em seu texto e sem previsão na legislação, (2) a declaração de inconstitucionalidade com uso de critérios menos rígidos que os estabelecidos no ordenamento legal e (3) a imposição de condutas ao setor público.
Para Reverbel (2009), ao contrário do que se poderia supor, o ativismo judicial não é instituto derivado da aplicação do sistema de Common Law, pois, neste, a criação do direito pela atuação judicial ("judge-made-law") diz respeito à análise dos casos concretos, não ao estabelecimento de novas regras gerais.
Já para Trindade e Morais (2011) o ativismo judicial tem suas origens no sistema jurídico norte-americano (Common Law), diante do papel da atividade jurisdicional, onde os precedentes constituem fonte do direito. No entanto, destaca-se que parte da doutrina entende que o modo de atuação da Suprema Corte norte-americana acabou fortalecendo a legislação positivada (Waldron, 2003, apud Trindade e Morais, 2011).
A propósito, cabe observar que, na sistemática defendida por Hans Kelsen, é admitida a possibilidade da criação de direito, diante da interpretação frente ao caso concreto, porém, com observância aos limites delimitados pela norma jurídica (Nunes, 2011; Teixeira, 2012).
Nesse sentido, Barroso (2011, apud Trindade e Morais, 2011) destaca que o ativismo judicial deveria estar ligado à expansão da atividade jurisdicional, numa participação mais ampla, mas sem criação de direito, sem o magistrado assumir o papel de legislador.
Calmon de Passos (1999, apud Cafezeiro, 2012) também observa a necessidade dos magistrados respeitarem os limites legais estabelecidos, sem os quais atuariam sem regras, com excessiva concentração de poder.
Não obstante, verifica-se uma postura distinta por parte dos defensores do ativismo judicial no Brasil. Aparentemente, para esses, não existe limite para a interpretação do direito, podendo o intérprete, o magistrado, adotar o posicionamento que pessoalmente considerar mais adequado, mesmo que em afronta ao texto da lei, desde que justificando sua decisão com base em princípios jurídicos (Nunes, 2011). Dessa maneira, o ativismo judicial se caracterizaria como um fenômeno amplo, complexo e perigoso para a ordem democrática constitucional (Trindade e Morais, 2011).
De qualquer modo, ao conferir discricionariedade aos juízes para criação de direito e gerenciamento processual, o ativismo judicial tem se mostrado contrário ao próprio direito, por permitir uma "justiça lotérica", imprevisível, basicamente calcada na escolha determinada pela consciência do julgador (Trindade e Morais, 2011).
Questiona-se o chamado positivismo legalista, em que o juiz teria meramente o papel de declarar a lei ("boca da lei"), mesmo que ponderando princípios e atribuindo valorações de ordem subjetiva. Indaga-se, porém, se a postura ativista seria uma melhor solução, ao conferir maior discricionariedade aos magistrados para invocar o que pessoalmente consideram justo. Afinal, tal liberdade de decisão, sem o devido enquadramento definido pelos limites legais, implica no decisionismo, no voluntarismo, na instituição da discricionariedade como inerente às decisões judiciais (Trindade e Morais, 2011).
Trata-se, no limite, de institucionalizar a insegurança jurídica, o que coloca em risco a própria existência do sistema judicial como marco regulatório da convivência em sociedade, posto que a concepção de justiça passa a ser aquela que for estabelecida por cada julgador, conforme seu entendimento e valoração de princípios jurídicos.

III. Do Ativismo Judicial Trabalhista
Por diversas razões, é reconhecido que o processo do trabalho não vem atendendo às expectativas sociais em termos de celeridade na solução de conflitos (Dalazen, 2005; Meireles e Borges, 2006; Maranhão, 2007; Fernandes, 2008; Vilela, 2011).
Dessa forma, há os que não concebem o fato que, a seu julgamento, o processo civil possa ser mais ágil que o processo do trabalho, tendo por base que tal situação afrontaria o princípio da proteção ao trabalhador, dado que seu crédito mereceria um tratamento privilegiado (Maior, 2006; Fernandes, 2008).
Ainda, para Fernandes (2008), existiria verdadeiro conluio no Congresso Nacional, que agiria atualizando o Código de Processo Civil ao mesmo tempo que impediria a atualização da Consolidação das Leis do Trabalho.
Para alguns juízes, deve-se buscar a aplicação de outras técnicas processuais, além da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), pois não consideram que o Congresso Nacional venha atualizar a legislação processual trabalhista em curto prazo (Chaves, 2010).
Para Jorge Luiz Souto Maior, juiz do trabalho no Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 2ª Região, o legislador teria dificuldade de compreender as necessidades do processo do trabalho, de modo que estaria justificado o ativismo judicial trabalhista (Maior, 2006).
Entendimento semelhante é adotado por Ney Stany Maranhão, juiz do trabalho no TRT da 8ª Região, que entende a necessidade de uma "inteligente atuação judicial", adotando-se uma "postura criativa", para compensar a falta de atualização da Consolidação das Leis do Trabalho (Maranhão, 2007).
No mesmo sentido, complementa Fernandes (2008) que o juiz deve adotar uma postura "desapegada da visão conservadora do Direito" e "tornar o processo trabalhista meio compatível com as atuais necessidades do obreiro", de modo que se justifique a aplicação de dispositivos legais como as regras do Código de Processo Civil e o Código Tributário Nacional no processo do trabalho.
Não obstante a temeridade desse tipo de postura, a aplicação de normas do processo civil no processo do trabalho pressupõe a verificação de dois requisitos: (1) que haja omissão na CLT sobre o tema e (2) que a norma do processo civil seja compatível com o processo do trabalho (Laurino, 2005).
Nesse sentido, a execução no processo do trabalho dispõe de características próprias, não verificadas no Código de Processo Civil, como é o caso do direito do devedor à nomeação de bens (conforme art. 882 da CLT1), o fato dos embargos à execução suspenderem o cumprimento da sentença (art. 899 e art. 893, §2°, da CLT2), entre outros. Portanto, não se pode negar que o processo do trabalho tenha suas características próprias, sua identidade, apenas se valendo do CPC como complemento de seu procedimento (Laurino 2005).
Apesar da definição de regramento próprio na CLT, com indicação de critérios claros de complementaridade, muitos juízes têm buscado soluções alternativas em nome da celeridade processual e do princípio protetivo, adotando postura nítida de ativismo judicial. Exemplo disso é a aplicação do art. 475-J do CPC em execuções trabalhistas, desconsiderando o procedimento da CLT (Vilela, 2011).

IV. Do Processo Sincrético
A lei 11.232/05 acabou com a separação entre o processo de conhecimento e de execução no Código de Processo Civil, instituindo o chamado processo sincrético (Laurino, 2005; Cardoso, 2010; Vilela, 2011; Leite, 2012, p. 1014).
Essa alteração teve como justificativa as dificuldades verificadas no modelo anterior, quando a execução do direito reconhecido em juízo constituía uma nova relação processual (Arruda Junior, 2009), tornando a efetivação da sentença por demais burocrática e lenta, causando frustração àquele que buscava a realização de seu direito junto ao judiciário.
Não obstante, para alguns, a CLT já trataria a execução como mera fase no processo trabalhista (Maior, 2006; Stürmer, 2010; Baraúna, 2010; Iyusuka, 2010; Leite, 2012, p. 1031) - a execução de sentença seria uma fase processual, enquanto a execução de título extrajudicial constituiria um processo (Leite, 2012, p. 1015).
Para outros, mesmo após a edição da lei 11.232/05 a execução trabalhista mantém sua autonomia, não se tratando a execução de mera fase processual (Meireles e Borges, 2006; Castelo, 2008, apud Vilela, 2011).
Ressalte-se que o processo civil e do trabalho são distintos entre si, de modo que alterações em um não causam revogação em outro (Teixeira Filho, 2006, apud Vilela, 2011).
Cabe observar que a CLT apenas trata da execução de pagar quantia certa, sendo aplicável o CPC no que diz respeito a obrigações de fazer ou não fazer e entrega de coisa, pois, aí sim, registra-se omissão em seu texto (Meireles e Borges, 2006).

V. Do Art. 475-J do Código de Processo Civil
O art. 475-J do CPC diz respeito ao cumprimento de sentença condenatória, especificamente de pagamento em dinheiro, sendo aplicável também no caso de outras modalidades de obrigação quando há conversão em reparação por perdas e danos.
A principal característica dessa norma é estabelecer o prazo de 15 dias para pagamento de valor previamente estabelecido ("quantia certa ou já fixada em liquidação"), sem o qual aplica-se multa no percentual de 10% sobre o montante devido:
Art. 475-J. Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação, não o efetue no prazo de quinze dias, o montante da condenação será acrescido de multa no percentual de dez por cento e, a requerimento do credor e observado o disposto no art. 614, inciso II, desta Lei, expedir-se-á mandado de penhora e avaliação.
§ 1° Do auto de penhora e de avaliação será de imediato intimado o executado, na pessoa de seu advogado (arts. 236 e 237), ou, na falta deste, o seu representante legal, ou pessoalmente, por mandado ou pelo correio, podendo oferecer impugnação, querendo, no prazo de quinze dias.
§ 2° Caso o oficial de justiça não possa proceder à avaliação, por depender de conhecimentos especializados, o juiz, de imediato, nomeará avaliador, assinando-lhe breve prazo para a entrega do laudo.
§ 3° O exeqüente poderá, em seu requerimento, indicar desde logo os bens a serem penhorados.
§ 4° Efetuado o pagamento parcial no prazo previsto no caput deste artigo, a multa de dez por cento incidirá sobre o restante.
§ 5° Não sendo requerida a execução no prazo de seis meses, o juiz mandará arquivar os autos, sem prejuízo de seu desarquivamento a pedido da parte.

VI. Da Aplicação do Art. 475-J do CPC no Processo Trabalhista
A execução, no processo trabalhista, tem regramento nos artigos 876 a 908 da CLT, sendo complementada primariamente pela Lei das Execuções Fiscais (lei 6.830/80) no que for compatível, em caso de omissão, conforme indica o art. 889 da CLT.
Nesse sentido, a CLT dispõe de regras específicas para o procedimento executório, como a possibilidade de execução de ofício e o prazo restrito de pagamento em 48 horas sob pena de penhora, além da necessidade de depósito recursal prévio, entre outras (Arruda Junior, 2009).
Não obstante, há os que defendem a aplicação primária do CPC como subsídio à execução trabalhista, só em seguida sendo considerada a lei 6.830/80, diante do fato do art. 882 da CLT estabelecer a ordem de penhora prevista no art. 655 do CPC4 e não no art. 11 da lei 6.830/805 (Vilela, 2011).
Observa-se, porém, que o art. 882 da CLT traz uma exceção à regra da aplicação primária da lei 6.830/80 como fonte complementar da execução trabalhista, não estabelecendo negação ao art. 889 da CLT.
Há ainda os que observam que o art. 1° da lei 6.830/809, ao estabelecer complementariedade com o CPC, justificaria a aplicação subsidiária primordial do CPC no preenchimento das lacunas da execução na CLT (Iyusuka, 2010).
Tal observação, porém, mostra-se uma tautologia. Se a CLT estabelece que a lei 6.830/80 e, em seguida, o CPC devem ser considerados para preenchimento de lacunas na execução trabalhista, que contradição existiria no fato da própria lei 6.830/80 indicar o CPC para aplicação subsidiária? Não existe conflito com o estabelecido no texto da Consolidação. Usar tal indicação para aplicar o CPC antes da lei 6.830/80, na execução trabalhista, implica em interpretação contrária ao texto legal.
Alguns destacam a aplicação da multa do art. 475-J do CPC por questões práticas, entendendo que sua incidência diminuiria a morosidade e a utilização de expedientes protelatórios por parte do devedor trabalhista (Rocha, 2008; Maranhão, 2007).
Cabe observar, porém, que a não observância da disciplina do art. 880 da CLT6, em favor do art. 475-J do CPC, implica em dificuldades práticas que levam à confusão processual. Além da diferenciação no prazo indicado nos dois dispositivos (48 horas no art. 880 da CLT e 15 dias no art. 475-J do CPC), a CLT prevê a citação para pagamento por oficial de justiça, multa e juros de mora contados a partir da data do ajuizamento da ação (art. 883 da CLT) e possibilidade de garantia da execução (art. 882 da CLT), entre outros (Oliveira, 2012).
Verifica-se ainda que muitas execuções não se efetivam por má-fé dos devedores, mas sim por falta de recursos (Calmon de Passos, 1995, apud Fernandes, 2008). Não parece correto considerar que a maior parte dos devedores trabalhistas, muitos dos quais não respondem por dívida de grande monta, prefiram arcar com todos os riscos e custos inerentes a um processo trabalhista (despesa com advogado, risco de penhora, inscrição em Banco Nacional de Devedores Trabalhistas, publicidade negativa etc.) do que efetivamente cumprir a obrigação e seguir com suas atividades profissionais.
Além disso, se, de um lado, a aplicação da multa de 10% sobre uma dívida trabalhista pode incentivar o devedor a adimplir logo com a obrigação, o resultado contrário pode ser igualmente previsto. O devedor pode ser instado a recorrer de tal decisão, prolongando a conclusão do processo, em detrimento justamente da apregoada celeridade processual. Ou, ainda, principalmente não dispondo de recursos de imediato, pode ser ver forçado a retardar o pagamento o máximo possível, de modo a diluir o efeito da multa no tempo - o impacto do aumento de 10% em pagamento em 30 dias é maior que seu impacto em pagamento 100 dias depois, por exemplo, quando não há incidência de nova multa, mas apenas de correção monetária e juros de mora. Portanto, uma vez aplicada a multa de 10%, pode ser interessante ao devedor retardar ao máximo o pagamento, de modo a diferir essa elevação no custo da dívida.
Há ainda os que defendem a aplicabilidade da multa do art. 475-J do CPC simplesmente porque entendem que, com sua imposição, o processo executório indicado na CLT não seria descaracterizado (Fernandes, 2008).
Tal posicionamento não se mostra adequado diante das regras claras apresentadas pela CLT, onde primeiro se considera o disposto em seu Título X (e especificamente em seu "Capítulo V - Da Execução"), depois a complementação com a lei 6.830/80 e, finalmente, a sistemática do Código de Processo Civil, sempre observando a compatibilidade com o procedimento indicado na CLT. Ignorar o critério estabelecido em lei, isto sim, corresponde à descaracterização do processo executório trabalhista.
Defende-se, também, que a expressão "casos omissos", no art. 769 da CLT8, que indica o uso do direito processual comum em caso de compatibilidade com as normas processuais trabalhistas, deve ser entendida com significado amplo, não apenas em caso de lacuna normativa no processo trabalhista (Chaves, 2007, apud Fernandes, 2008; Leite, 2007).
O art. 769 está inserido no Capítulo I do Título X da CLT, que trata das disposições preliminares que regem o processo judicial trabalhista. Por sua vez, o Capítulo V do mesmo Título X trata especificamente da execução. Nesse capítulo, verificamos que o art. 899 estabelece o critério a ser considerado em complemento à eventual lacuna legislativa (primeiro se considera a lei 6.830/80, depois o Código de Processo Civil).
Verifica-se, portanto, que o art. 769 estabelece uma regra geral para o processo trabalhista, enquanto o art. 899 disciplina uma regra específica para a execução.
Observa-se, ainda, que o art. 899 disciplina os critérios aplicáveis especificamente no que diz respeito aos "trâmites e incidentes do processo da execução", o que inibe a extrapolação de aplicação de regramento previsto na CLT ou das normas que indica subsidiariamente (lei 6.830/80 e, depois, o CPC). Tal é suficiente para refutar a possibilidade de aplicação do art. 475-J do CPC no processo do trabalho, ou qualquer outra norma que não respeite os limites legais definidos pelo legislador.
Não existe, assim, fundamento para entender a expressão "casos omissos" do art. 769 da CLT como revogadora do art. 899 e como autorização para complemento das normas de execução ao entendimento do julgador. Mesmo que não se concorde com o procedimento indicado na CLT, este se mostra suficientemente conciso e claro para não permitir interpretações teratológicas, como a que pretende justificar o ativismo judicial no próprio texto da Consolidação.
Outro argumento que se apresenta diz respeito à caracterização de omissão quando uma lei se mostra em desarmonia com os valores sociais atuais, se revelando injusta. Desse modo, a não aplicação do art. 475-J do CPC na execução trabalhista seria injusta e, por isso, poderia ser considerado que há uma omissão axiológica na CLT (Leite, 2007; Rocha, 2007).
De fato, caracteriza-se uma lacuna axiológica na lei quando a norma existente é injusta, quando não presta uma aplicação satisfatória ao direito (Diniz, 2001, apud Leite, 2007).
Ressalte-se que consideramos aqui especificamente da aplicação do art. 475-J do CPC no processo trabalhista, de modo que não se refuta a possibilidade de eventual interpretação axiológica em outras matérias. Porém, cabe indagar se a injustiça de uma lacuna axiológica não seria intensificada pelo desrespeito ao ordenamento legal, diante da aplicação de regra não prevista, em desconsideração aos princípios constitucionais da legalidade (art. 5°, inciso II10), do devido processo legal (art. 5°, inciso LIV11), do direito ao contraditório e ampla defesa (art. 5°, inciso LV12), entre outros.
Se é dever (e não faculdade) do juiz interpretar a lei de acordo com a Constituição (Marinoni, 2005, apud Leite, 2007), não se pode admitir a arbitrariedade em selecionar quais direitos indicados na Carta Magna devem ser considerados em detrimento de outros, como se não estivessem escritos, para se descaracterizar a normatização legal e criar um regramento híbrido, não respeitando o texto da lei e nem mesmo a própria Constituição. Que direito seria esse, fundando apenas em juízos de valor, se é que se poderia falar em direito? Não é sem razão que Karl Larenz (1997, apud Leite, 2007) destaca que, no preenchimento de lacunas legais, deve ser observado um limite de possibilidades, dentro dos princípios diretivos do ordenamento jurídico, e "diante de razões de grande peso".
Como observa Marinoni (1993, apud Souza, 2008), o texto constitucional estabelece os institutos e princípios gerais a fundamentar o direito processual ("teoria constitucional do processo"), garantindo a participação das partes, o direito ao contraditório, ampla defesa e, dentro desse contexto, a adequada tutela jurisdicional. Dessa forma, não é possível ignorar completamente um aspecto processual disciplinado constitucionalmente em detrimento de outro.
Estabelecer a seleção de princípios, constitucionais ou não, quando não existe lacuna específica no ordenamento jurídico, por não se considerar que o regramento seja justo, não corresponde à interpretação axiológica e preenchimento de lacunas legais. Trata-se de legislar, de criar procedimentos próprios de escolha de cada julgador, o que afronta o próprio direito e estabelece a subjetividade como princípio máximo.
Também não se pode considerar como juridicamente válido o argumento que, mesmo levando em conta a necessidade de se observar os preceitos constitucionais, considera que a multa do art. 475-J do CPC pode ser aplicada no processo trabalhista simplesmente porque não existe uma multa disciplinada a esse respeito na CLT, sendo essa a omissão (Oliveira, 2012; Martins, 2012, p. 767).
Tal posicionamento implicaria em inferir a obrigatoriedade do legislador disciplinar punição equivalente em qualquer âmbito processual, ou seja, qualquer punibilidade aplicada em um regramento teria que ser absorvida por outro, não se admitindo a falta de multa impositiva, de procedimento próprio, ou mesmo que um sistema indicasse multa em percentual inferior a outro. E, conforme já observado, restariam desrespeitados os princípios constitucionais que regem o processo.
Alternativamente, a defesa da aplicabilidade do art. 475-J do CPC no processo trabalhista é justificada perante a adoção de uma interpretação teleológica e fundamentada em princípios constitucionais, como o da razoável duração do processo (art. 5°, inciso LXXVIII, da Constituição Federal13), diante da força normativa da Constituição Federal (Maranhão, 2007).
Nesse sentido, Fernandes (2008) afirma que se o juiz não aplicar o art. 475-J do CPC na execução trabalhista estará afrontando o art. 5°, inciso LXXVIII, da Constituição Federal, e que a não observância das normas do Código de Processo Civil, como primeira fonte de aplicação subsidiária na execução, constitui afronta à prestação jurisdicional efetiva.
Observamos que, da mesma forma que a Constituição Federal indica a necessidade da celeridade processual, com igual importância determina, como cláusulas pétreas, o respeito ao estipulado em lei (art. 5°, inciso II), ao devido processo legal (art. 5°, inciso LIV) e o direito ao contraditório e ampla defesa (art. 5°, inciso LV), conforme já exposto. Como se pode justificar, então, a celeridade processual para adoção de regramento do CPC sem previsão na CLT, em detrimento de princípios constitucionais igualmente relevantes? Não se trata de ponderar princípios, mas, sim, de admitir que o juiz tenha o poder de dizer quais artigos da própria Constituição Federal são constitucionais e quais não devem ser considerados, em termos processuais.
Em sentido semelhante, Pricladnitzky (2011) justifica a aplicação da multa do art. 475-J do CPC com base no direito fundamental de ação, em consonância com o direito à razoável duração do processo (celeridade processual), que seriam direitos fundamentais estabelecidos na Constituição Federal.
Cabe destacar que o direito fundamental de ação, à ampla defesa, contraditório, duração do processo, respeito às leis, entre outros princípios constitucionais, devem ser observados na prática processual. Afinal, quando se fala em direito fundamental de ação, é de se esperar que as regras estejam estabelecidas, não sendo alteradas pela arbitrariedade de cada juízo. Portanto, não se mostra adequado considerar direito de ação e celeridade processual sem levar em conta outros direitos fundamentais estabelecidos na Constituição Federal, sem observar ao efetivo devido processo legal.
Do mesmo modo, não se justifica a defesa do direito de ação para viabilizar a penalização a uma das partes do processo sem a devida previsão legal, requisito necessário quando se pretende assumir uma postura interpretativa, pois não se adequa à técnica o uso de analogia para prejudicar um sujeito processual (in malam partem) e estabelecer sanções além das já previstas (bis in idem), em direta ofensa ao princípio da legalidade (Pegado, 2012).
Desconsiderar o regramento da execução trabalhista, tal como indicado na CLT, significa negar sua própria vigência e desrespeitar a garantia constitucional do devido processo legal (Arruda Junior, 2009), como se os fins justificassem os meios e a celeridade fosse o objetivo único do processo, acima da própria justiça.
Desse modo, o posicionamento pela aplicação do art. 475-J do CPC em procedimentos especializados, como é o caso da execução trabalhista, advém de uma interpretação não sistemática do direito processual, em desconsideração ao texto legal e desrespeito aos princípios e garantias constitucionais (Arruda Junior, 2009).
Também se mostra relevante destacar a questão do prazo para adimplemento da obrigação. O art. 475-J do CPC estabelece o prazo de 15 dias para pagamento, prazo este maior que o indicado no regramento da CLT (art. 880), que é de 48 horas. Portanto, tal prorrogação se mostraria prejudicial ao empregado, em afronta ao princípio protetivo que rege o direito do trabalho (Arruda Junior, 2009).
Vê-se, assim, uma nítida contradição, já que normalmente os defensores da aplicação da multa do art. 475-J do CPC no processo trabalhista justificam tal posicionamento diante do princípio de proteção ao trabalhador e da necessidade de maior celeridade processual. Mas como falar em celeridade processual quando o prazo para pagamento é estendido?
Diante disso, há os que defendem a aplicação do prazo de 48 horas estabelecido no art. 880 da CLT combinado com a multa de 10% indicada no art. 475-J do CPC (Vilela, 2011; Maior, 2006, apud Fernandes, 2008; Martins, 2012, p. 768). Ou, ainda, que seja aplicado o prazo de 8 dias para sentença líquida (por ser esse o prazo aplicado para recurso ordinário ou agravo de petição no processo do trabalho) e de 48 horas em caso de sentença ilíquida, após sua efetiva liquidação (Leite, 2012, p. 1021).
Assim, não se trata mais apenas da aplicação do art. 475-J do CPC no processo trabalhista, e sim de fundi-lo com o art. 880 da CLT ou outros elementos do ordenamento, para, como resultado, produzir uma regra nova, um artigo híbrido, uma combinação do previsto em regramentos distintos, sem qualquer previsão legal a respeito.
Esse procedimento é característico da chamada Teoria da Acumulação, que defende o fracionamento dos textos normativos, para que sejam selecionados ("pinçados") institutos que se entenda mais adequados a cada caso. Tal postura desconsidera o direito como um sistema, inviabilizando a interpretação, integração e aplicação das regras jurídicas, pois implica na submissão ao posicionamento ideológico de cada julgador (Delgado, 2012, p. 179).
No limite, admitir esse tipo de composição traria consequências nefastas para o direito e implicaria no fim de qualquer expectativa de segurança jurídica, ao conferir aos magistrados o arbítrio para, dada uma sistemática legal disponível e usando princípios, selecionarem a regra processual desejada, sem maior rigor científico e respeito ao ordenamento legal.
Tal prática prejudicaria particularmente o pólo passivo no processo, impedindo seu direito constitucional de ampla defesa, além de apresentar dificuldades práticas para o cumprimento da obrigação (Carvalho, 2007, apud Fernandes, 2008).
Mesmo que se admita a aplicação do art. 475-J do CPC no processo do trabalho, não pode ser considerado prazo de pagamento distinto do estabelecido no mesmo (15 dias), posto que esse é o prazo considerado pelo legislador para a aplicabilidade da multa de 10% prevista no referido artigo (Chaves, 2006, apud Vilela, 2011).
Iyusuka (2010) justifica a adoção do prazo de 48 horas, em concomitância com a multa do art. 475-J do CPC, diante do disposto no art. 832, §1°, da CLT14, defendendo que o juiz teria discricionariedade para determinar a forma e o prazo para cumprimento de sentença, o que estaria vinculado à garantia da celeridade processual do art. 5°, inciso LXXVIII, da Constituição Federal. No mesmo sentindo, Leite (2012, p. 1031-1032) indica o art. 832 da CLT para justificar alteração nos critérios estabelecidos para execução.
Essa interpretação, porém, recai nos mesmo vícios já apontados anteriormente. Primeiro porque não leva em conta a aplicação sistemática dos princípios constitucionais processuais, conforme exposto.
Segundo, cabe observar que o art. 832 da CLT estabelece regra geral, posto que se insere na Seção X ("Da Decisão e Sua Eficácia"), do Capítulo II, que trata das regras "Do Processo em Geral". De sua parte, o art. 880 está inserido na Seção II ("Do Mandado e da Penhora"), que faz parte do Capítulo V, que estabelece as regras específicas da Consolidação para a realização "Da Execução".
Dessa forma, se existe uma regra específica, aplicada para o caso de execução por quantia certa, por que desconsiderá-la diante de uma regra de caráter geral? Não se verifica a ligação proposta por Iyusuka (2010) entre a inadequação de critério específico com um princípio constitucional, mormente quando desconsidera princípios igualmente relevantes, como o do respeito ao ordenamento legal (que necessariamente teria que ser desconsiderado para se admitir a solução indicada).
Mesmo que se considere importante a aplicação da multa do art. 475-J do CPC para incentivar o pagamento de dívida trabalhista, sua aplicação no processo do trabalho só pode ser admitida com previsão legal, o que depende de alteração na CLT, sem a qual trata-se apenas de adoção de analogia in malam partem, para prejudicar uma das partes no processo (Mallet, 2006, apud Vilela, 2011; Pegado, 2012).
Diante do exposto, não se justifica a aplicação do art. 475-J do CPC no processo trabalhista. Os argumentos baseados em princípios e consideração parcial da Constituição Federal, com seleção de normas esparsas na legislação disponível para criação de um regramento próprio e individualizado, mostram-se inadequados para a ciência jurídica.
O resultado que adviria da aplicação de princípios para determinação de regras próprias, em detrimento do regramento estipulado em lei, seria o incentivo à discricionariedade, em detrimento do importante e relegado princípio da segurança jurídica (Nunes, 2011).
Apesar da multa do art. 475-J do CPC ser correntemente aplicada pelas Varas do Trabalho (Oliveira, 2012) e vários tribunais terem posicionamento favorável, inclusive definido em súmulas e orientações jurisprudenciais (Pedroso, 2012), destaque-se que, pelo menos até o momento, é posição consolidada no Tribunal Superior do Trabalho que o art. 475-J do CPC não se aplica na execução trabalhista (Vilela, 2011) - embora para Leite (2012, p. 1032-1038) tal entendimento ainda não esteja pacificado no âmbito do TST.
         
VII. Conclusão
Diante dos argumentos analisados, entende-se que a aplicação do art. 475-J do CPC no processo trabalhista implica em admitir um movimento de ativismo judicial que se pauta no entendimento pessoal de cada julgador, sem respaldo em lei, que apenas se justifica com princípios. Tal posicionamento permitiria a cada julgador a criação de seu próprio código de processo, apoderando-se de regras esparsas na legislação disponível, para aplicar conforme própria conveniência.
Permitir que os juízes possam decidir sem considerar os limites estabelecidos no ordenamento legal implica em quebra do pacto federativo, na separação de poderes, ao propiciar o funcionamento do judiciário como autêntico poder legislador. Alguns juízes chegam a adotar tal postura abertamente, por entenderem que o Congresso Nacional é muito lento ou incapaz de atualizar o regramento legal.
Cabe ponderar, ainda, se o poder legislativo se manterá inerte diante dessa invasão de competência pelo judiciário, postura que, infelizmente, já adota ante o poder executivo.
Finalmente, não se espera que o presente trabalho terá frutos em fazer repensar a postura daqueles que são partidários da ideologia de ativismo judicial ilimitado. Para esses, como visto, a interpretação jurídica que não tenha como fundamento princípios constitucionais selecionados (ou quaisquer outros que sirvam de fundamento à defesa de suas teses) será considerada como retrógrada, positivista, "kelsiana", conservadora etc.
Não se espera algo diferente, pois, julgar (e legislar) com base em princípios não implica em respeitar a lógica do sistema normativo, nem agir em conformidade com a ciência jurídica. Afinal, o ativismo judicial sem limites implica na arbitrária adoção de códigos legais individuais que se justificam por si mesmos, e, por isso, falsamente respaldados em princípios legais.


NOTAS:
1. CLT, Art. 882 - O executado que não pagar a importância reclamada poderá garantir a execução mediante depósito da mesma, atualizada e acrescida das despesas processuais, ou nomeando bens à penhora, observada a ordem preferencial estabelecida no art. 655 do Código Processual Civil.

2. CLT, Art. 899 - Os recursos serão interpostos por simples petição e terão efeito meramente devolutivo, salvo as exceções previstas neste Título, permitida a execução provisória até a penhora.
(...)
Art. 893 - Das decisões são admissíveis os seguintes recursos:
(...)
§ 2º - A interposição de recurso para o Supremo Tribunal Federal não prejudicará a execução do julgado.

3. CLT, Art. 889 - Aos trâmites e incidentes do processo da execução são aplicáveis, naquilo em que não contravierem ao presente Título, os preceitos que regem o processo dos executivos fiscais para a cobrança judicial da dívida ativa da Fazenda Pública Federal.

4. CPC, Art. 655.  A penhora observará, preferencialmente, a seguinte ordem:
I - dinheiro, em espécie ou em depósito ou aplicação em instituição financeira;
II - veículos de via terrestre;
III - bens móveis em geral;
IV - bens imóveis;
V - navios e aeronaves;
VI - ações e quotas de sociedades empresárias;
VII - percentual do faturamento de empresa devedora;
VIII - pedras e metais preciosos;
IX - títulos da dívida pública da União, Estados e Distrito Federal com cotação em mercado;
X - títulos e valores mobiliários com cotação em mercado;
XI - outros direitos.

5. Lei 6.830/80, Art. 11 - A penhora ou arresto de bens obedecerá à seguinte ordem:
I - dinheiro;
II - título da dívida pública, bem como título de crédito, que tenham cotação em bolsa;
III - pedras e metais preciosos;
IV - imóveis;
V - navios e aeronaves;
VI - veículos;
VII - móveis ou semoventes; e
VIII - direitos e ações.

6. CLT, Art. 880.  Requerida a execução, o juiz ou presidente do tribunal mandará expedir mandado de citação do executado, a fim de que cumpra a decisão ou o acordo no prazo, pelo modo e sob as cominações estabelecidas ou, quando se tratar de pagamento em dinheiro, inclusive de contribuições sociais devidas à União, para que o faça em 48 (quarenta e oito) horas ou garanta a execução, sob pena de penhora.

7. CLT, Art. 883 - Não pagando o executado, nem garantindo a execução, seguir-se-á penhora dos bens, tantos quantos bastem ao pagamento da importância da condenação, acrescida de custas e juros de mora, sendo estes, em qualquer caso, devidos a partir da data em que for ajuizada a reclamação inicial.

8. CLT, Art. 769 - Nos casos omissos, o direito processual comum será fonte subsidiária do direito processual do trabalho, exceto naquilo em que for incompatível com as normas deste Título.

9. Lei 6.830/80, Art. 1º - A execução judicial para cobrança da Dívida Ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e respectivas autarquias será regida por esta Lei e, subsidiariamente, pelo Código de Processo Civil.

10. CF, Art. 5°, II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;

11. CF, Art. 5°, LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;

12. CF, Art. 5°, LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;

13. CF, Art. 5°, LXXVIII - a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.

14. CLT, Art. 832, § 1º - Quando a decisão concluir pela procedência do pedido, determinará o prazo e as condições para o seu cumprimento.


BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
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13 de jun. de 2014

Golpe do Cheque Motivo 20

Vender aceitando pagamento em cheque é algo muito perigoso. Existem várias possibilidades de golpes. E, principalmente, quando há ingenuidade e falta de cuidado por parte do vendedor, como nesse caso que chegou ao meu conhecimento:
Em determinada loja, atuando há pouco tempo no mercado, foi realizada uma venda de R$ 4.100,00, com pagamento à vista em cheque.
O vendedor não se preocupou em conferir a documentação do comprador. Apenas observou que o cheque era de boa procedência e não constava nenhum registro em órgão de consulta (Serasa). Além disso, o comprador tinha boa aparência, bons modos e inspirava confiança.
Pior ainda, a pessoa que retirou as mercadorias era outra. E assinou o canhoto da nota fiscal de modo que o nome ficou ilegível. O vendedor não anotou o nome por extenso, nem o CPF do retirante. Nem mesmo conferiu seus documentos.
No dia seguinte, o cheque foi depositado e retornou com a indicação "motivo 20". Conforme Circular 3.535 do Banco Central do Brasil, tal registro refere-se ao seguinte:
Art. 1º Os motivos de devolução de cheques a seguir passam a ter as seguintes descrições e especificações de utilização:
(...)
II - motivo 20 - cheque sustado ou revogado em virtude de roubo, furto ou extravio de folhas de cheque em branco, a ser utilizado na devolução de cheque objeto de sustação ou revogação realizada mediante apresentação de boletim de ocorrência policial e declaração firmada pelo correntista relativos ao roubo, furto ou extravio de folhas de cheque em branco;
Tentaram entrar em contato com o comprador, mas não conseguiram falar com ele. Nunca estava em casa, sua mãe atendida, dizia que daria recado, mas nada. O celular também não funcionava. Isso levantou suspeitas.
Curiosamente, algum tempo depois, consulta ao sistema Serasa começou a indicar o registro de "Documentos Roubados, Furtados ou Extraviados". O titular do cheque havia sido furtado quase dois meses antes da realização da compra. Vê-se, portanto, que pode existir, conforme particularidades de cada caso, um lapso de tempo significativo entre uma ocorrência e seu registro. Desse modo, é um erro confiar apenas nesse tipo de consulta, como fez a loja.
Mas, diante da dificuldade de comunicação com o titular do cheque, a loja resolveu fazer um registro negativo, de pendência financeira, em seu nome (Pefin).
Recebi a documentação e tentei entrar em contato com o titular do cheque. Sem sucesso. Nunca estava em casa, quem atendia anotava recado, mas ninguém ligava de volta.
Assim, de posse do cheque, fui a três cartórios para verificar se o titular do cheque tinha registro de assinatura, pois observei, em consulta na internet, que ele estava vendendo um imóvel. Tinha registro em um cartório, mas a assinatura era diferente.
Também tentei decifrar quais os nomes possíveis da pessoa que assinou o canhoto da nota fiscal e verifiquei se havia registro em cartório. Nenhum registro a respeito, mas informaram que consultas sem o número do CPF não eram muito confiáveis.
Isso deixou claro que a situação era um golpe. Assim, solicitei à empresa que retirasse imediatamente o registro negativo contra o titular do cheque - antes que isso causasse prejuízos ao mesmo, podendo resultar em pleito por reparação de perdas e danos.
Por fim, realizei a ação que deveria ter tomado em primeiro lugar (mas não fiz por questões de logística): fui à agência bancária do titular do cheque.
Antes, porém, consultei a respeito no site do Banco Central do Brasil. A Resolução 3.972/2011 diz o seguinte:
Art. 6º A instituição financeira sacada é obrigada a fornecer, mediante solicitação formal do interessado, as informações adiante especificadas, conforme os casos indicados:
(...)
III - declaração sobre a autenticidade ou não da assinatura do emitente, mediante exame equivalente ao que seria realizado em procedimento de pagamento de cheque apresentado ao caixa, em se tratando de cheque devolvido por sustação ou revogação motivada por furto, roubo ou extravio de folha de cheque em branco.
Assim, preparei um requerimento, assinado por sócio da empresa, com a seguinte solicitação:
Nos termos do art. 6°, III, da Resolução n° 3.972 do Banco Central do Brasil, solicitamos emissão de Declaração Sobre Autenticidade ou Não da Assinatura do Emitente, referente cheque abaixo indicado e anexo, sustado pelo motivo 20:
CHEQUE N° XXXXXX
CONTA: XXXX-X
TITULAR: XXXXXXXXXXXX
De posse desse requerimento, em duas vias, mais o cheque, cópia do contrato social e de procuração da empresa, fui até a respectiva agência.
O gerente analisou a documentação, pediu o cheque e afirmou: "de cara já digo que essa não é a assinatura dele!"
Mas aí veio outro funcionário do banco, dizendo que existia resolução do Banco Central impedindo que a instituição passasse informações sobre o titular da conta em caso de cheque furtado.
Concordei e disse que não queria informações sobre o titular, apenas a conferência da assinatura. E saquei a cópia da resolução 3.972/2011, que levei com as respectivas passagens marcadas. Só restou a ele assentir e dizer que iria orientar o pessoal a respeito.
No mais, eles me atenderam bem, confirmaram que foi um caso com registro de boletim de ocorrência, que o titular da conta teve, inclusive, o celular roubado (por isso que não funcionava, quando liguei).
Mostraram-me o registro da assinatura. Completamente diferente. Comprovado tratar-se de um golpe. Diante da falta de qualquer documento que pudesse ensejar cobrança a respeito, considerei o caso resolvido. Valor perdido.
Fica o exemplo para os incautos.

REFERÊNCIAS CONSULTADAS:
BRASIL. Banco Central do Brasil. Circular 3.535 de 16/5/2011. Disponível em: <http://www.bcb.gov.br/pre/normativos/busca/normativo.asp?tipo=circ&ano=2011&numero=3535>. Acesso em: 16 mai. 2014.
BRASIL. Banco Central do Brasil. Resolução 3.972 de 28/4/2011. Disponível em: <http://www.bcb.gov.br/pre/normativos/busca/normativo.asp?tipo=res&ano=2011&numero=3972>. Acesso em: 16 mai. 2014.

1 de jun. de 2014

As Portas da Percepção

"As Portas da Percepção" e "Céu e Inferno" consistem de ensaios onde Aldous Huxley trata de sua experiência com o uso de drogas, na busca por uma maior percepção, posto que o autor apresentava certo inconformismo com as limitações do corpo humano.
Na introdução do livro que reúne esses ensaios, Manuel da Costa Pinto adverte que essas experiências dizem respeito ao uso da mescalina, que não causaria alucinações, mas uma espécie de alargamento da percepção do mundo.
Interessante notar que essa experiência de Huxley com a mescalina, droga elaborada a partir de um cacto considerado sagrado por certos índios americanos, serviu de inspiração a Jim Morrison na criação da banda de rock The Doors (As Portas).
Huxley descreve que, ao conhecer um pesquisador, se propôs a servir de cobaia e tomar 4 decigramas de mescalina, em meio copo d'água, para observar quais seriam os resultados.


Do efeito da droga, ele relata que, com certa decepção, não foi tomado de visões, como esperava. O que aconteceu foi que teve uma diferente percepção da realidade, como destaca nas passagens seguintes:
A modificação que realmente ocorreu nesse mundo nada teve de revolucionária. Meia hora depois de ingerir a droga, comecei a perceber um lento bailado de luzes douradas. Pouco depois surgiram imponentes superfícies rubras que cresciam e se avolumavam a partir de brilhantes nódulos de energia a assumir continuamente as mais variadas formas. De outra feita, ao fechar os olhos, deparava-me com um complexo de estruturas cinzentas, de dentro das quais brotavam, incessantemente, pálidas esferas azuladas que se iam materializando e, à medida que o faziam, deslizavam silenciosamente para cima e fugiam de cena. Mas em tempo algum apareceram faces ou formas de homens ou animais. Nada de paisagens, espaços abissais, mágico crescimento e metamorfose de edificações, nada que lembrasse, por remoto que fosse, um drama ou uma parábola. O outro mundo ao qual a mescalina me conduzira não era o mundo das visões; ele existia naquilo que eu podia ver com meus olhos abertos. A grande transformação se dava no reino dos fatos objetivos. O que tinha acontecido a meu universo subjetivo era coisa que, relativamente, pouco importava.
(...) O que mais ressaltava era a constatação de que as relações espaciais tinham perdido muito do seu valor e de que minha mente tomava contato com o mundo exterior em termos de outras dimensões que não as de espaço. Em situações normais o olho se preocupa com problemas tais como Onde? — A que distância? — Como se situa em relação a tal coisa? Durante a experiência com a mescalina, as perguntas tácitas a que a visão responde são de outra ordem. Lugar e distância deixam de ter muito interesse. A mente elabora a compreensão das coisas em termos de intensidade de existência, profundidade de importância, relações dentro de um determinado padrão. Eu olhava para os livros, mas não me preocupava, em absoluto, com suas posições no espaço. O que notava, o que se impunha por si mesmo à minha mente, era o fato de que todos eles brilhavam com uma luz viva e que, em alguns, o resplendor era mais intenso que em outros. Nesse instante, a posição e as três dimensões eram questões de menos. Não, evidentemente, que a noção de espaço houvesse sido abolida. Quando me levantei e pus-me a andar, eu o fiz com toda a naturalidade, sem erros de apreciação sobre a posição dos objetos.
O espaço ainda estava ali; mas havia perdido sua primazia. A mente se preocupava, mais do que tudo, não com medidas e lugares, e sim com a existência e o significado.
Desse modo, Huxley teve uma experiência sobre a percepção da realidade. Ele destaca que o cérebro funcionaria como um filtro da realidade, a limitar a nossa percepção, como forma de nos precaver de um excesso de informações que tornaria difícil qualquer interpretação do mundo, diante de nossas limitações físicas.
Refletindo sobre minha experiência, vejo-me levado a concordar com o eminente filósofo de Cambridge, Dr. C. D. Broad, "que será bom considerarmos, muito mais seriamente do que até então temos feito, o tipo de teoria estabelecida por Bergson, com relação à memória e ao senso de percepção. Segundo ela, a função do cérebro e do sistema nervoso é, principalmente, eliminativa e não produtiva. Cada um de nós é capaz de lembrar-se, a qualquer momento, de tudo o que já ocorreu conosco, bem como de se aperceber de tudo o que está acontecendo em qualquer parte do universo. A função do cérebro e do sistema nervoso é proteger-nos, impedindo que sejamos esmagados e confundidos por essa massa de conhecimentos, na sua maioria inúteis e sem importância, eliminando muita coisa que, de outro modo, deveríamos perceber ou recordar constantemente, e deixando passar apenas aquelas poucas sensações selecionadas que, provavelmente, terão utilidade na prática".
Essa experiência permite que o autor faça uma interessante reflexão sobre a tendência dos seres humanos em buscar respostas nos seus pensamentos, na realidade que interpretam, em seu mundo interior, até mesmo como forma de se protegerem da severidade, da austeridade, dos dilemas, que a realidade impõe. Claro que, por outro lado, essa tendência humana pode resultar nas mais diversas implicações, na medida em que a realidade, mesmo posta, acaba sendo suplantada por crenças e percepções individuais.
Conclui-se perfeitamente, à luz dos documentos e rituais religiosos, bem como dos monumentos da poesia e das artes plásticas que chegaram até nós, que, na maioria das épocas e dos lugares, os homens têm atribuído maior importância a suas visões interiores que às coisas objetivas que conhecem. Têm julgado que o que vêem, quando de olhos cerrados, possui maior importância espiritual que o visto à luz do dia. Qual a razão para isso? A familiaridade gera indiferença, e o problema da sobrevivência é de uma premência que vai da tediosa rotina à tortura. É para o mundo exterior que abrimos os olhos todas as manhãs, é nele que, de bom ou de mau grado, temos de procurar viver. No mundo interior não há trabalho nem monotonia. Visitamo-lo apenas em sonhos e devaneios, e sua singularidade é tal que nunca encontramos o mesmo mundo em duas ocasiões sucessivas. Que há, pois, de espantoso em preferirem os seres humanos, via de regra, olhar para dentro de si mesmos, em sua busca do sublime?
Em resumo, e considerando outros casos, o autor verificou os seguintes sintomas:
1. A capacidade de lembrar-se e de raciocinar corretamente não sofre redução perceptível. (Ouvindo os registros de minha conversação, quando sob o efeito da droga, nada me leva a concluir que estivesse mais estulto do que sou sob condições normais.)
2. As impressões visuais tornam-se grandemente intensificadas e o olho recupera um pouco da inocente percepção da infância, quando o senso não se achava direta e automaticamente subordinado à concepção. O interesse pelo espaço diminui e a importância do tempo cai quase a zero.
3. Embora o intelecto nada sofra e a percepção seja grandemente aumentada, a vontade experimenta uma grande transformação para pior. O indivíduo que ingere mescalina não vê razão para fazer seja o que for, e considera profundamente injustificável a maioria das causas que, em circunstâncias normais, seriam suficientes para motivá-lo e fazê-lo agir. Elas não o preocuparão, pela simples razão de ter ele melhores coisas em que pensar.
4. Essas melhores coisas podem ser experimentadas (tal qual se deu comigo) lá fora, aqui dentro ou em ambos os mundos — o interior e o exterior, simultânea ou sucessivamente. Que elas são melhores, isso parece axiomático a quem quer que tome mescalina, desde que possua um fígado são e uma mente isenta de angústias.
Huxley observa que a mescalina traz resultados diferentes conforme as características de cada indivíduo, como ele comenta um tanto quanto ironicamente:
Os indivíduos de imaginação mais fértil são, em sua maioria, transformados em visionários pela mescalina. Alguns deles - e seu número talvez seja bem maior do que geralmente se admite - não necessitam de transformação; são permanentemente visionários.
Outra questão interessante abordada pelo autor diz respeito à comparação que ele faz com outras práticas, como a ingestão controlada de dióxido de carbono e seus efeitos para apaziguar os limites que o cérebro imporia à percepção da realidade. Ele compara esses resultados também com práticas de cunho religioso e místico, como jejum, mantras, flagelos etc. Seriam aspectos que causariam visões de certa forma análogas às experiências obtidas com drogas como a mescalina. Além disso, ele observa que existem aspectos fisiológicos e psicológicos de cada indivíduo que podem trazem diferentes percepções quanto a essas experiências.
Huxley não faz exatamente uma apologia ao uso de drogas, na verdade ele considera a mescalina uma droga superior a outras (como maconha, cocaína e LSD), porém, ainda não a considera a substância ideal para intensificar experiências pessoais. De qualquer modo, o autor identifica uma certa hipocrisia em não se discutir essa possibilidade do uso de substâncias químicas como forma de potencializar uma maior compreensão, uma maior percepção, seja do mundo, seja de si mesmo.

REFERÊNCIA CONSULTADA:
HUXLEY, Aldous. As Portas da Percepção & Céu e Inferno. Disponível em: <http://www.planonacionaldeleitura.gov.pt/clubedeleituras/upload/e_livros/clle000124.pdf>. Acesso em: 06 mai. 2014.