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27 de jul. de 2014

Justiça do Trabalho no Brasil

O Direito do Trabalho no Brasil tem características de rigidez e intervencionismo estatal, dificultando a adequação das relações de trabalho diante da dinâmica econômica (Siqueira Neto, 1996, apud Busnello, 2000; Ferretti & Funchal, 2011).
Ao contrário de outros países, no Brasil a margem de negociação nos contratos coletivos de trabalho é limitada e restrita pelo ordenamento legal, onde se inclui a Constituição Federal, a Consolidação das Leis do Trabalho, súmulas e orientações jurisprudenciais do Tribunal Superior do Trabalho, súmulas do Supremo Tribunal Federal, Código Civil, entre outros. Além disso, a maior parte das propostas que tramitam no Congresso Nacional dizem respeito à área trabalhista - portanto, a tendência é de ainda mais regulamentação (Pastore, 2010; Pastore, Werner & Marx, 2011).
O principal código que rege a legislação trabalhista, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), foi criado em 1943, no governo do presidente Getúlio Vargas, tendo inspiração fascista e se caracterizando por uma ideologia corporativista, em prol da intervenção estatal em todos os aspectos da vida social (Gonzaga, 2003; Lourenção, 2011; Costa, 2005).
A Justiça do Trabalho adota ênfase em posicionamentos que incentivam um viés protecionista e assistencialista, assumindo exclusividade na resolução de conflitos laborais e podendo anular qualquer disposição firmada em acordo ou convenção coletiva (Pastore, Werner & Marx, 2011).
Iniciativas como a Lei da Arbitragem (Lei 9.307/1996) e a criação de Comissões de Conciliação Prévia (Lei 9.958/2000), que permitiriam maior possibilidade de composição entre as partes e redução da carga de processos, acabaram rechaçadas e esvaziadas por parte do Ministério Público do Trabalho e da própria Justiça do Trabalho (Pastore, Werner & Marx, 2011).
A esse respeito, destaca-se o depoimento do juiz Grijaldo Coutinho, ex-presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho, a Pessanha & Morel (2011):
(...) O golpe de misericórdia, que praticamente liquidaria a CLT, previa a mudança do Artigo 618, que estabelece[ria] a prevalência do negociado sobre o legislado.
(...) Era ano de eleições, e o PT mobilizou a oposição para somente votar a medida provisória que garantia a prorrogação da CPMF caso a mudança da CLT saísse da pauta. Ao tomar posse, o Lula mandou arquivar o projeto.
Em sentido contrário, as mesmas autoras registram o depoimento do juiz Theodomiro R. dos Santos:
Eu sempre fui contrário ao poder normativo, que representa uma herança do regime corporativista do Estado Novo, correspondendo ao Estado paternalista. Para termos uma classe operária e comerciários fortes, atuantes, com poder de reivindicação, será sempre preciso estimular a sua organização, ao invés de nos colocarmos em seu lugar. O Estado não deve substituir os órgãos de representação dos trabalhadores. Isso é péssimo para a organização do povo. [Mas] Da maneira como a situação está posta, o que resta à Justiça do Trabalho é o papel de polícia. Quando a greve atingir o interesse público, o interesse da comunidade, a coletividade, os tribunais serão chamados a interferir. A questão é: quem define o que é prejudicial ao interesse social?
Dessa forma, verifica-se, no Brasil, não apenas rigidez nas relações de trabalho, mas uma ideologia dominante, inclusive no ensino de direito e formação de advogados, que acaba por inibir qualquer discussão a respeito de maior flexibilidade nos contratos de trabalho. Corrobora para tal o fato do país não ter atravessado crise de desemprego aparente nos últimos anos (Pastore, Werner & Marx, 2011).
Além disso, a Justiça do Trabalho tem, como regra, a atribuição de superioridade jurídica ao trabalhador, como forma de proteção, sob o pressuposto que esse é inferiorizado na relação econômica com o empregador. Nesse sentido, considera-se, como princípio, que eventual dúvida na resolução de uma lide deve ser considerada em favor do empregado (in dubio pro operario), pois a este deve ser aplicada a norma mais favorável, a condição que lhe seja mais benéfica (Martins, 2004, apud França, 2005; Süssekind, 2004, apud Amado, 2010).
Na aplicação do Direito do Trabalho, verifica-se a defesa de decisões com base em princípios jurídicos, mesmo em detrimento do estabelecido no texto legal, o que implica em grande insegurança jurídica (Trindade & Morais, 2011; Nunes, 2011; Arruda Junior, 2009; Teixeira, 2012).
A esse respeito, pesquisa realizada junto a magistrados trabalhistas indicou a prevalência de entendimento que o direito instituído (legislado) não pode ser atingido pela negociação direta. E que, por outro lado, o judiciário pode reinterpretar a legislação, com base em princípios jurídicos (Pessanha & Morel, 2008).
No mesmo sentido, pesquisa de Castellar (2005, apud Timm, 2006) indicou que os juízes preferem "fazer justiça social", em detrimento da mera aplicação da lei na revisão de contratos.
Diante desse contexto, acaba por prevalecer uma cultura de falta de confiança nas relações de trabalho no Brasil, onde os Tribunais do Trabalho julgam mais de dois milhões de caso por ano (Robortella, 2011, apud Pastore, Werner & Marx, 2011; França, 2011, apud Pastore, Werner & Marx, 2011).

REFERÊNCIAS CONSULTADAS:

AMADO, João L. O Papel da Jurisprudência no Preenchimento de Conceitos Laborais Indeterminados: in Dubio Pro Operario? Revista OABRJ, v. 26, n. 2, jul./ dez., 2010. Disponível em: <http://revista.oabrj.org.br/wp-content/uploads/2012/02/Revista_OABRJ_v26n2.pdf>. Acesso em: 27 set. 2013.

ARRUDA JUNIOR, Antonio C. M. de. A Aplicabilidade do Artigo 475-J do Código de Processo Civil no Processo do Trabalho. Revista Eletrônica Faculdade de Direito da PUC-SP, São Paulo, v. 2, 2009. Disponível em: <http://revistas.pucsp.br/index.php/red/article/view/1715/1098>. Acesso em: 30 mar. 2013.

BUSNELLO, Ronaldo. Reestruturação Produtiva e Flexibilização Dos Direitos Trabalhistas. Revista Direito em Debate, v. 9, n. 14, 2000. Disponível em: <https://www.revistas.unijui.edu.br/index.php/revistadireitoemdebate/article/view/80>.
Acesso em: 27 jun. 2013.

COSTA, Márcia da S. O Sistema de Relações de Trabalho no Brasil: Alguns Traços Históricos e Sua Precarização Atual. Revista Brasileira de Ciências Sociais, v. 20, n 59, 2005. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-69092005000300008>. Acesso em: 28 set. 2013.

FERRETTI, Renata C.; FUNCHAL, Bruno. O Efeito da Regulação Trabalhista e Tributária Nos Investimentos no Brasil. Revista de Administração Mackenzie, v. 12, n. 4, 2011. Disponível em: <http://editorarevistas.mackenzie.br/index.php/RAM/article/view/2854>. Acesso em: 24 set. 2013.

FRANÇA, Luzimar B. A "Nova" Concepção de Relação de Trabalho. Revista Pegada, v. 6, n. 1, 2005. Disponível em: <http://revista.fct.unesp.br/index.php/pegada/article/viewArticle/1298>. Acesso em: 27 jun. 2013.

GONZAGA, Gustavo. Labor Turnover And Labor Legislation in Brazil. Economía, v. 4, n. 1, Latin American and Caribbean Economic Association (LACEA), 2003. Disponível em: <http://www.jstor.org/stable/20065453>. Acesso em: 06 jul. 2013.

LOURENÇÃO, Manuela da P. C. G. O Princípio da Congruência no Processo Individual do Trabalho. Dissertação (Mestrado em Direito do Trabalho e Seguridade Social). Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. São Paulo, 2011. Disponível em: <http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2138/tde-13122012-163252/pt-br.php>. Acesso em: 07 jul. 2013.

NUNES, Luiz Roberto. Ativismo Judicial. Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, Campinas, n. 38, 2011. Disponível em: <http://bdjur.stj.jus.br/dspace/handle/2011/41524>. Acesso em: 27 mar. 2013.

PASTORE, José. A CLT se Complica Cada Vez Mais. O Estado de S. Paulo, 03/08/2010. Disponível em: <http://www.josepastore.com.br/artigos/rt/rt_295.htm>. Acesso em: 08 jul. 2013.

PASTORE, José; WERNER, Eichhorst; MARX, Paul. Crises Econômicas e Flexibilidade no Trabalho: os Casos da Alemanha e do Brasil. São Paulo: CNI, 2011. Disponível em: <http://www.cni.org.br/portal/data/pages/FF80808133FB79C10134007E4C882B80.htm>. Acesso em: 22 set. 2013.

PESSANHA, Elina; MOREL, Regina. Setenta Anos da Justiça do Trabalho no Brasil: Algumas Reflexões. Revista OAB/RJ, n. 1, v. 24, 2008. Disponível em:<http://revista.oabrj.org.br/wp-content/uploads/2012/02/Revista_OABRJ_v26n2.pdf>. Acesso em: 22 set. 2013.

TEIXEIRA, Anderson V. Ativismo Judicial: nos limites entre racionalidade jurídica e decisão política. Revista Direito GV, São Paulo, n. 15, jan./jun. 2012. Disponível em: <http://direitogv.fgv.br/publicacoes/revista/artigo/ativismo-judicial-limites-entreracionalidade-juridica-decisao-politica>. Acesso em: 02 mai. 2013.

TIMM, Luciano B. Direito, Economia e a Função Social do Contrato: em Busca Dos Verdadeiros Interesses Coletivos Protegíveis no Mercado do Crédito. Revista de Direito Bancário e do Mercado de Capitais, v. 22, 2006. Disponível em: <http://www.gv.br/biblioteca/pe/SP000515251.pdf>. Acesso em: 22 set. 2013.

TRINDADE, André K.; MORAIS, Fausto S. de. Ativismo Judicial: as Experiências Norte-Americana, Alemã e Brasileira. Revista da Faculdade de Direito UFPR, Curitiba, n. 53, 2011. Disponível em: <http://ojs.c3sl.ufpr.br/ojs2/index.php/direito/article/viewArticle/30764>. Acesso em: 07 jul. 2013.

20 de jul. de 2014

Olavo de Carvalho X Aleksandr Dugin

O debate entre Olavo de Carvalho e Aleksandr Gel'yevich Dugin constitui um texto excelente para compreensão do mundo atual.
De um lado, Dugin se revela como um propagandista político do pensamento eurasianista, de cunho totalitário, que procura aglutinar ideologias fracassadas como fascismo e comunismo.
De outro lado, Carvalho mostra uma concepção sólida do mundo, atacando diretamente as contradições do pensamento eurasianista e deixando Dugin sem respostas.


OLAVO DE CARVALHO:
"It would be wonderful if each country learned how to heal its own evils before pretending to be the savior of humanity. Alexandre Dugin’s Russia seems to have taken the opposite lesson from her crimes and failures."



Nesse confronto, percebemos que Dugin foi encurralado, não podendo atacar de frente as ideias que lhe foram apresentadas, diante da defesa de seu contraditório posicionamento político. Praticamente não houve debate.
Chama atenção o fato de Dugin defender um ponto de vista avesso à liberdade individual, pela concentração de poderes no Estado, de adotar uma postura contra os Estados Unidos e o Ocidente, classificando o mundo de maneira maniqueísta. Talvez por isso, infelizmente, o pensamento eurasianista tenha grande potencial para se difundir no Brasil.


ALEKSANDR DUGIN:
"(...) The USA is an absolute plague for the mankind. And the globalist elite is the quintessence of USA, it rules USA and through it in the rest of the world. The globalist elite of the USA is the absolute enemy of the Russia, China and Islamic countries, it corrupts our political elite, the society, the country. For us it is obvious."




Além de apresentar as forças que hoje influenciam os destinos do mundo, a leitura do debate nos leva a refletir sobre as perspectivas sombrias quanto ao futuro da humanidade.
O debate entre Olavo de Carvalho e Aleksandr Dugin está disponível em livro ("Os Eua e a Nova Ordem Mundial") e no blog abaixo (em inglês):
http://debateolavodugin.blogspot.com.br/

12 de jul. de 2014

Admirável Mundo Novo

"Admirável Mundo Novo", escrito por Aldous Huxley em 1931, destaca-se pelo caráter visionário, embora Huxley observe (em prefácio de 1946) não estar muito preocupado com o avanço da tecnologia em si, mas em como o desenvolvimento científico afetaria a vida do homem em sociedade.


O autor descreve uma sociedade futura onde os indivíduos são condicionados a um papel social antes mesmo do nascimento - o ser humano não seria mais concebido por métodos naturais, seria incubado em órgãos do Estado, que já condicionaria os indivíduos para a função que desempenhariam na sociedade.
Assim, o Estado substitui as famílias. E, além de gerir os nascimentos, possui centros de condicionamento com função de preparar os novos integrantes da sociedade não só para o trabalho, mas também para o consumo e a vida sexual. Também não há tolerância com frustrações e infelicidade, pois, para todas as intempéries, existe uma droga sem efeitos colaterais.
Nesse sistema totalitarista não há espaço para quem pense diferente, para desenvolver a própria individualidade. O final do livro mostra isso de forma trágica, com a vitória da mesmice, do condicionamento, da lavagem cerebral, sobre o pensamento livre.

REFERÊNCIA CONSULTADA:
HUXLEY, Aldous. Admirável Mundo Novo. Disponível em: <http://pensamentosnomadas.files.wordpress.com/2013/06/aldous-huxley-admirc3a1vel-mundo-novo-lido.pdf>. Acesso em: 11 jul. 2014.