Da leitura de "Intervencionismo: uma análise
econômica", de Ludwig von Mises, destaco alguns pontos relevantes para o
direito econômico e análise da concorrência.
Pressuponho o pensamento de Mises como mais adequado
à compreensão da realidade que os conceitos das teorias econômicas que ainda
fundamentam o paradigma atual, refletindo em legislação concorrencial cujo
efeito é justamente o contrário do alegado.
O direito econômico (concorrencial) está calcado, conforme
se infere da teoria neoclássica, no entendimento que a concorrência tende a
gerar uma situação de desequilíbrio, o que justificaria a intervenção
governamental para impedir que a disputa de mercado cause um problema de
concentração monopolista.
Nada mais equivocado que essa visão. Os monopólios,
na verdade, são criados pela intervenção estatal, não são o resultado da
concorrência no mercado.
O caso dos monopólios é particularmente
significativo. É possível, e até mesmo provável, que numa economia de mercado
que não seja obstruída pela intervenção governamental venham a ocorrer
situações que possibilitem, ainda que temporariamente, o exercício de preços
monopolísticos. Pode-se admitir como provável, por exemplo, que mesmo numa
economia de livre mercado venha a se formar um monopólio internacional do
mercúrio, ou que existam monopólios locais de alguns materiais de construção e
de combustíveis. Mas esses casos isolados de ocorrência de preços monopolistas
não seriam suficientes para criar algo que se devesse qualificar como o
'problema do monopólio'. Todos os monopólios nacionais e – com poucas exceções
– todos os monopólios internacionais devem a sua existência à legislação
tarifária. Se os governos realmente quisessem acabar com os monopólios bastaria
usar os meios que têm à sua disposição – bastaria eliminar todas as barreiras
tarifárias. Se fizessem apenas isso, o 'problema do monopólio' perderia a sua
importância. Na verdade, os governos não estão interessados em acabar com os
monopólios; ao contrário, são eles que criam as condições que permitem aos
produtores exercer preços monopolistas. (p. 102)
As forças de mercado tendem a destruir os monopólios
- elas simplesmente não propiciam um ambiente de estabilidade, mas de
insegurança constante, onde as empresas devem lutar para conquistar e manter
posições (vide as 5 forças concorrenciais identificada por Michael Porter aqui).
O problema é que a teoria neoclássica, que fundamenta
o direito econômico, confunde concentração de mercado com monopólio. Concentração
de mercado não implica necessariamente uma situação perene de dominância para
as empresas líderes. O simples fato de uma empresa se expandir, de dominar um
mercado maior (desde que o faça sem precisar de proteção do estado), pode
significar que ela está atendendo de maneira mais efetiva os desejos dos
consumidores. Nesse sentido, a concentração de mercado seria sinal de sucesso
empresarial.
Mises explica que o sucesso das empresas não se dá
como uma imposição à sociedade, mas como reconhecimento de seus consumidores:
Um exame superficial poderia nos levar a imaginar que
são os empresários que decidem o que deve ser produzido e como deve ser
produzido. Entretanto, como eles produzem não para satisfazer suas próprias
necessidades, mas para atender a necessidades de terceiros, é preciso que seus
produtos sejam vendidos, no mercado, aos consumidores, ou seja, para aqueles
que desejam consumi-los. Assim sendo, o empresário só poderá ser bem-sucedido e
realizar um lucro se for capaz de produzir melhor e mais barato, vale dizer,
com um menor dispêndio de material e mão de obra, os artigos mais urgentemente
desejados pelos consumidores. Portanto, são os consumidores e não os
empresários que determinam o que deve ser produzido. Numa economia de mercado o
consumidor é o soberano. É ele que manda, e o empresário tem que se empenhar,
no seu próprio interesse, em atender seus desejos da melhor maneira possível.
(p. 20)
A teoria neoclássica fundamenta-se na análise do
equilíbrio de mercado, quando o que caracteriza a eficiência de mercado não é o
equilíbrio, mas a dinâmica da mudança, a busca de oportunidades de negócio, a
inovação, a "destruição criadora" destacada por Schumpeter, "o
processo de mercado" apontado por Kirzner (ver aqui).
Diante disso, torna-se injustificável a atuação do
direito da concorrência. Afinal, trata-se de grande pretensão acreditar que
burocratas estatais tenham o conhecimento, verdadeira onisciência, para regular
a economia acima da interação das forças de mercado. Não se mostra justificável
a intervenção estatal, exceto por si mesma, como garantia de privilégios aos
burocratas, aos políticos e seus apoiadores.
Apesar de todas as tentativas de refutar esse
argumento, o fato é inquestionável. Se o mercado não for obstruído, as forças
que nele atuam tendem a usar os meios de produção da maneira que melhor
satisfaça as necessidades humanas. Quando a autoridade interfere nesse processo
fazendo com que os fatores produtivos sejam usados de forma diferente, o
resultado inexorável é a diminuição da oferta; não há como aumentá-la com
medidas restritivas. (p. 37)
Todos sabem que essas coisas são apresentadas ao
público sob uma ótica diferente. A opinião pública tem sido levada a acreditar
que as barreiras tarifárias não reduzem a oferta; ao contrário, aumentam-na.
Proteger o pequeno empresário da competição com a grande empresa (big
business), proteger o pequeno varejista da competição com as lojas de
departamentos e cadeias de lojas são apresentadas como medidas que favorecem o
bem-estar geral e evitam que o consumidor seja explorado pelas grandes
organizações. Essa tem sido a maneira de conseguir apoio para políticas cuja
verdadeira essência consiste em conceder privilégios e vantagens para
determinados grupos à custa dos outros grupos da comunidade. (p. 39)
REFERÊNCIA
CONSULTADA:
MISES, Ludwig von. Intervencionismo: uma análise econômica. São Paulo: Instituto
Ludwig von Mises, 2010. Disponível em: <http://www.mises.org.br/Ebook.aspx?id=32>.
Acesso em: 02 fev. 2015.