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15 de fev. de 2016

Comentários à Lei da Arbitragem

I. Da arbitragem
Inicialmente, considera-se que arbitragem é a situação onde as partes em conflito se submetem à decisão de um terceiro, por elas escolhido (Simini, Araújo, Borges, 2015).
Dentre as vantagens da arbitragem, Tura (2012 apud Cappelletti, Laier, 2015) destaca: a confidencialidade da controvérsia, a especialização ao tratar da matéria e a confiança estabelecida entre as partes e o árbitro escolhido.
Portanto, em princípio, a convenção arbitral para dirimir conflitos relativos a direitos disponíveis mostra-se como via adequada. Trata-se, inclusive, de ambiente indicado e adequado para resolução de temas de natureza negocial (Martins, 2004).
II. Sobre Anti-suit Injunctions
Anti-suit injunction diz respeito à ordem para que se proíba as partes para ingressarem ou continuarem com determinado processo - trata-se de uma injunção (imposição), uma ordem contra um processo (Paganelli, 2011).
De um lado, a anti-suit injunction pode ser favorável ao procedimento arbitral, ao impedir manobras que poderiam postergar ou impedir a solução de um conflito - quando usada para impedir o acesso a uma jurisdição incompetente. Por outro lado, e principalmente quando a administração pública está envolvida, pode ocorrer o uso de anti-suit injuctions como forma de tornar inválido o compromisso arbitral firmado, mesmo após seu início (Paganelli, 2011).
De forma a diferenciar essas situações, Phull (2011) denomina de anti-arbitration injunction o uso de medidas judiciais para tornar inválido um acordo arbitral, enquanto anti-suit injunction diria respeito a determinação para que o caso não seja tratado em âmbito de jurisdição estatal, mas mediante procedimento arbitral. Ou seja, anti-arbitration injunction diria respeito a medidas para bloquear o compromisso arbitral, enquanto anti-suit injunction visaria assegurar a realização da arbitragem, impedindo que o caso seja solucionado pelo poder judiciário estatal.
III. Arbitragem e Administração Pública
Dado o princípio da indisponibilidade do interesse público, existe no Brasil resistência quanto à transação na solução de litígios envolvendo a administração pública (Simini, Araújo, Borges, 2015).
Quando o estado atua diretamente em prol dos interesses sociais, do interesse público ("interesse público primário" - por mais subjetivo que seja isso), em suma, diante de seu poder legal de coerção (poder de império), temos uma situação de indisponibilidade, onde não poderia ser admitida a atuação arbitral.
Por outro lado, quando o estado interfere na economia fazendo uso de empresas públicas ou de economia mista, deve ser considerado, no que possível, o mesmo tratamento dado às pessoas jurídicas de direito privado, como forma de se evitar um privilégio odioso em favor da administração pública. Nessa condição, a administração pública deve ser considerada como capaz de firmar obrigações como a convenção de arbitragem (é o que se chama de "arbitrabilidade subjetiva").
Embora esses conceitos sejam obscuros, o que deve prevalecer, em suma, é a verificação se a questão em análise de refere a interesses patrimoniais e se esses interesses seriam disponíveis.
Portanto, levando em conta o histórico formalista que caracteriza o poder judiciário e a administração pública, bem com o fato das alterações promovidas pela lei 13.129/15 serem recentes e diante, ainda, de certa obscuridade na delimitação de conceitos, seria ingenuidade considerar que a discussão sobre aplicabilidade da via arbitral encontra-se encerrada.
A internalização da arbitragem, no Brasil, como meio válido, alternativo e autônomo, notadamente quando envolve a administração pública (mas não só) é um paradigma a ser mudado aos poucos, posto que esbarra em uma cultura formalista, protecionista, hierarquizada e corporativa, excessivamente direcionada para direitos sem considerar o outro lado da balança, as obrigações. Exemplo disso é a firme resistência na adoção da via arbitral em relações de consumo e de trabalho.
IV. Considerações Finais
Sabe-se que existe uma crise do poder judiciário, caracterizada pela burocratização e lentidão na prestação de solução aos litígios, o que vem impedindo a efetividade do acesso à justiça na realidade brasileira (Cappelletti, Laier, 2015; Silva, 2015).
Existe uma tendência de desjudicialização dos litígios, de modo a se obter maior celeridade na solução de conflitos sem os contratempos da atuação estatal (Cappelletti, Laier, 2015).
Verificamos que, ao passar do tempo, a alternativa de arbitragem vem sendo inserida nos contratos administrativos. Podemos acompanhar a respeito, por exemplo, na legislação seguinte: lei 9.472/1997 (telecomunicações), lei 9.478/97 (petróleo e gás), lei 10.233/2001 (transportes), lei 10.438/2002 (setor elétrico), lei 11.079/2004 (parceria público-privada), lei 11.196/2005 (pesquisa e desenvolvimento), lei 11.909/2009 (gás natural) e, finalmente, a lei 13.129/2015.
Pode-se inferir, portanto, que existe uma tendência em prol da adoção da arbitragem como meio válido para atender as necessidades sociais na resolução de conflitos, inclusive envolvendo a administração pública.
Não obstante, infelizmente, a ideologia predominante no Brasil ainda impede a discussão arraigada sobre a real necessidade de existência de empresas públicas e de economia mista. Isso poderá fragilizar a mudança de paradigma, na medida que interesses políticos, que regem essas entidades, poderão fazer uso indevido de aspectos como a confidencialidade arbitral para acertos e desvios de recursos - em casos assim, acaba-se discutindo a consequência (o procedimento adotado) e não a causa (a existência de empresas públicas e de economia mista, geridas por interesses políticos).
Além disso, outro aspecto a se observar é que a evolução da alternativa arbitral, embora seja tendência internacional, se insere em outro contexto, qual seja, o reconhecimento tácito da incapacidade do estado em prestar os serviços públicos demandados pela sociedade (dentre os quais a resolução de conflitos).
Nesse contexto, é interessante observar que o estado acaba delegando a prestação de serviços para a sociedade. Mas isso não acontece como forma do estado diminuir sua interferência, antes o contrário: o estado continua expandindo sua influência, absorvendo recursos da sociedade, porém, transfere serviços e custos.
Exemplo a respeito são as obrigações tributárias (os tributos aumentam e as obrigações também, com a operacionalização da arrecadação "terceirizada" para o contribuinte). A disseminação da arbitragem, no Brasil, tende a seguir o mesmo caminho. Não implicará em redução ou aumento de eficiência do poder judiciário. Será uma medida alternativa, com novos custos para as partes já pagadoras de impostos - e tendo ainda que lutar contra interesses corporativos que impedem a maior disseminação do procedimento arbitral.

Referências Consultadas:

BRASIL. Lei n° 9.307, de 23 de setembro de 1996. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L9307.htm>. Acesso em: 05 jan. 2016.

BRASIL. Lei n° 13.129, de 26 de maio de 2015. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Lei/L13129.htm>. Acesso em: 09 jan. 2016.

CAPPELLETTI, Priscila L. Q., LAIER, Maria G. A. O Entendimento Contemporâneo Acerca do Princípio do Acesso à Justiça: uma análise a partir da realidade brasileira. Revista Jurídica Cesumar, v. 15, n. 1, 2015. Disponível em: <http://periodicos.unicesumar.edu.br/index.php/revjuridica/article/view/3095>. Acesso em: 05 jan. 2016.

LEMES, Selma F. Jurisprudência Brasileira Sobre Arbitragem e Sociedade de Economia Mista: uma lição pedagógica. Disponível em: <http://selmalemes.adv.br/artigos/Arbitragem%20e%20SEM.%20Jurisprud%C3%AAncia%20Pedag%C3%B3gica.pdf>. Acesso em: 10 jan. 2016.

MARTINS, Pedro B. A. A Arbitragem e as Entidades de Direito Público. Valor Econômico, São Paulo, 12 jul. 2004.

PAGANELLI, Celso J. M. Anti-Suit Injunctions na Mediação e Arbitragem. Revista Âmbito Jurídico, v. XIV, n. 95, dez 2011. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=10858>. Acesso em: 09 jan 2016.

Phull, Chetan. U.S. Anti-suit Injunctions in Support of International Arbitration: five questions American courts ask. Journal of International Arbitration, v. 28, n. 1, pp. 21-50, 2011. Disponível em: <http://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=1773929>. Acesso em: 09 jan. 2016.

SIMINI, Danilo G.; ARAÚJO, Lucas P.; BORGES, Diego M. Análise da Conciliação em Matéria Tributária à Luz da Indisponibilidade do Interesse Público. Revista Científica da Fundação Educacional de Ituverava, v. 12, n. 1, 2015. Disponível em: <http://www.nucleus.feituverava.com.br/index.php/nucleus/article/view/1398>. Acesso em: 05 jan. 2016.

SILVA, Renata F. S. A Conciliação e Sua Efetividade na Solução de Conflitos Repetitivos Envolvendo a Fazenda Pública. Revista Direito Unifacs, n. 177, 2015. Disponível em: <http://www.revistas.unifacs.br/index.php/redu/article/view/3511>. Acesso em: 05 jan. 2016.

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