O mês de outubro de 2016 vem
se revelando particularmente ruim para o comércio, com desempenho muito pior do
que se poderia esperar. É o que venho percebendo no acompanhamento de situações
reais - e não pela análise de índices econômicos agregados e defasados.
Em 1998, eu trabalhava numa
fábrica de móveis. No início do último trimestre daquele ano, faltavam pedidos
e as vendas no comércio estavam fracas. Isso não era normal, por se tratar de
um mercado sazonal, que historicamente registrava alta de vendas no final do
ano e programação de entregas por parte dos lojistas.
No entanto, a partir da
segunda quinzena de novembro a situação mudou. Lembro que um supervisor de
vendas chegou a comentar que os lojistas "nunca venderam tanto".
Porém, com a chegada do
primeiro trimestre de 1999, a queda das vendas foi brutal, mesmo considerando a
sazonalidade.
Minha explicação: em 1998 o
Brasil atravessava um período de turbulência e desconfiança econômica, sofrendo
impacto da crise na Rússia. A taxa de juros era elevadíssima (a Selic chegou a
passar de 40% a.a.!), o desemprego era alto e havia grande desconfiança quanto
aos chamados "países emergentes", com notícias econômicas negativas afetando
a confiança de consumidores e investidores.
Nesse cenário, as vendas no
final de 1998 aumentaram por reflexo, por tradição (período natalino,
sazonalidade), pela liberação de uma intenção de consumo que estava represada.
E, com a chegada de 1999, a situação se estabilizou no patamar real, que era um
cenário muito ruim.
Algo semelhante pode ocorrer
para o final de 2016, afetando a indústria e o comércio de bens duráveis
(principalmente). Senão vejamos:
A taxa de juros é alta, mas
não tanto quando no período da crise da Rússia. Porém, o desemprego parece ser
maior - diante de revisões realizadas pelo IBGE, o desemprego atual atinge
13,6% das pessoas com idade para trabalhar (cerca de 22 milhões - e não me
surpreende se esse número for ainda maior).
Além disso, passamos por um
cenário de políticas econômicas desastrosas, só comparável aos planos
mirabolantes da época do presidente Collor, com o país atravessando um período
de grave recessão. E temos, neste fim de ano, situação de estados e prefeituras
quebrados, em dificuldade para pagar salários. Por fim, a instabilidade
política, embora menor, ainda deve continuar - há uma necessidade de retomada
de confiança do governo federal, que leva tempo e está sujeita a incertezas.
Portanto, quem acompanha a
economia real, e não apenas indicadores econômicos defasados e gerais, há de
concordar que a situação de crise não passou e que estamos ainda no fundo do
poço, principalmente nos setores de bens de consumo duráveis.
Assim, fazendo uma analogia
comedida, considero que o final de 2016 e começo de 2017 terá cenário de vendas
com viés semelhante ao da transição 1998-1999.
O comércio de bens duráveis
verificará aumento nas vendas apenas no período final do ano (a partir da
segunda quinzena de novembro, principalmente), em retomada do consumo que no
momento está represado. No entanto, preparem-se para um primeiro trimestre de
2017 muito difícil para o segmento de bens de consumo duráveis - talvez até o
pior de todos os tempos.
Depois, porém, há perspectiva
de melhora gradual. A projeção atual, de crescimento do PIB por volta de 1%
para 2017, é modesta porque a base de comparação é baixa (dada a hecatombe
econômica que se verifica desde 2014) e porque há mudança de perspectivas
(salvo o surgimento de novas turbulências decorrentes de instabilidade política).