Nos últimos anos o Tribunal de
Justiça do Estado do Espírito Santo (TJES) vem sendo um mau exemplo no respeito
à Lei de Responsabilidade Fiscal (lei complementar 101/2000).
Não se pretende aqui
considerar as causas do problema, nem relatar todas as medidas que vêm sendo
adotadas a respeito, mas analisar o seguinte:
A lei estadual 10.278/2014
determinou alteração na lei 7.854/2003 (que trata do plano de carreiras do
Poder Judiciário), estabelecendo:
Art. 1º Os dispositivos da Lei nº 7.854, de 22.9.2004
– Plano de Carreiras e de Vencimentos dos Servidores Efetivos do Poder Judiciário
do Estado do Espírito Santo, abaixo relacionados, passam a vigorar com a
seguinte redação:
(...)
“Art. 39-A. A primeira promoção dos servidores
que ingressaram por meio do concurso público disciplinado pelo edital 01/2010
será suspensa nos anos de 2015 e 2016, somente ocorrendo no ano de 2017.”
Destaque-se a ilegalidade em
direcionar a suspensão de promoção especificamente para o grupo de servidores
do concurso de edital 01/2010.
Posteriormente, a lei
10.470/2015 determinou a suspensão de promoções para todos os servidores:
Art. 1º Ficam suspensos os efeitos financeiros
das promoções dos servidores do Poder Judiciário do Estado do Espírito Santo,
previstas no caput do art. 13 da Lei nº 7.854, de 22.9.2004, enquanto não
houver o reequilíbrio da gestão fiscal deste Poder, na forma da Lei
Complementar nº 101, de 04.5.2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal).
Não obstante, cabe considerar
se a suspensão de promoções estaria contemplada na Lei de Responsabilidade
Fiscal (LRF), bem como na Constituição Federal (cujo art. 169 trata a respeito
de despesas com pessoal).
A esse respeito, consideremos
os entendimentos jurisprudenciais a seguir:
APELAÇÃO CÍVEL. REMESSA
OFICIAL. CÂMARA LEGISLATIVA. RESOLUÇÃO 229/07. SUSPENSÃO DE PROGRESSÃO
FUNCIONAL. ILEGALIDADE. LC 101/00.
A adequação das
despesas com pessoal aos limites previstos na LC 101/00 deve observar as
medidas nela previstas, coincidentes com as especificadas na Constituição
Federal, dentre as quais não se inclui a suspensão de progressão funcional e respectivo padrão determinada pela Resolução
229/07, da Câmara Legislativa, que não pode modificar, mesmo temporariamente, a
referida Lei de Responsabilidade Fiscal nem muito menos, de forma reflexa, a
CF.
(TJ-DF - APC:
20080110706404 DF 0002558-92.2008.8.07.0001, Relator: FERNANDO HABIBE, Data de
Julgamento: 05/11/2014, 4ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no DJE :
20/11/2014 . Pág.: 132)
AÇÃO DECLARATÓRIA DE
DIREITO Ã PROGRESSÃO FUNCIONAL NOS TERMOS PREVISTOS EM LEGISLAÇÃO MUNICIPAL -
Recusa de progressão fundada, entre outras razões, em restrições impostas pela
Lei Complementar nº. 101/2000 - Aplicação afastada da Lei de
Responsabilidade Fiscal, que não tem o condão de se sobrepor a direito
adquirido de servidor.
(...)
(TJ-SP - APL: 994080943230
SP, Relator: José Luiz Germano, Data de Julgamento: 19/10/2010, 2ª Câmara de
Direito Público, Data de Publicação: 03/11/2010)
Quanto ao TJES, podemos
verificar o entendimento adotado no julgamento do Mandado de Segurança n°
0006008-38.2016.8.08.0000:
1. A partir do exato
momento em que o sujeito atende aos requisitos legalmente estipulados, adquire
o direito então previsto, o qual passa a fazer parte de sua esfera de
disponibilidade, cabendo-lhe exercê-lo ou não, ficando imune, nesta medida, a
alteração legislativa posterior.
(...)
4. Ante a exasperação dos
limites de gastos com pessoal, mesmo com o emprego de seguidas medidas de
contenção, não resta alternativa senão reconhecer o direito aqui
pleiteado, condicionando, contudo, a satisfação patrimonial à existência de
disponibilidade financeira e de margem segura para fins de atendimento aos
limites estipulados na Lei de Responsabilidade Fiscal.
Assim, temos que, de um lado,
a LRF não poderia ser utilizada para supressão de direitos, como a promoção
para os servidores que alcançaram os requisitos legalmente estabelecidos. Por
outro lado, a LRF determina nulidade para aumento de despesas com pessoal caso
não observados seus limites (art. 21) - só que com ressalva para determinação
legal ou contratual (art. 22, I).
Parece, portanto, que não
poderia o tribunal suspender as promoções de carreira determinadas em lei, mas
sim considerar as medidas elencadas no art. 169 da Constituição e na LRF.
A questão deve ser resolvida pelo
Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade
nº 5606, que questiona o art. 1° da lei 10.470/2015 (citado acima, a respeito
da suspensão das promoções dos servidores).
Quanto aos servidores
atingidos, observamos que a lei 10.278/2014 (que suspendeu a promoção dos ingressantes
pelo concurso do edital 01/2010) entrou em vigor em 06/10/2014. Por sua vez, a
lei 10.470/2015, que suspendeu promoção para todos os servidores, iniciou
vigência em 18/12/2015.
Desse modo, para aqueles que
foram prejudicados apenas pela lei 10.470/2015, aconselha-se aguardar o
julgamento da ADI 5606.
Já para os ingressantes pelo
concurso de edital 01/2010, que tenham preenchido os requisitos legais nos anos
de 2015 e 2016, é aconselhável ajuizar ação porque a ADI 5606 não trata especificamente
da lei 10.278/2014.
REFERÊNCIAS CONSULTADAS:
BRASIL. Constituição da
República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em:
<https://tinyurl.com/hs9khee>. Acesso em: 16 ago. 2017.
BRASIL. Lei Complementar nº
101, de 4 de maio de 2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal). Disponível em:
<https://tinyurl.com/cr523b4>. Acesso em: 16 ago. 2017.
BRASIL. Supremo Tribunal
Federal (STF). Ação Direta de Inconstitucionalidade - ADI 5606 (em
tramitação). Disponível em: <https://tinyurl.com/yaknhp5b>. Acesso em: 16
ago. 2017.
BRASIL. Tribunal de Justiça
do Estado do Espírito Santo (TJES). Mandado de Segurança nº
0006008-38.2016.8.08.0000. Diário da Justiça Eletrônico de 18/10/2016.
BRASIL. Tribunal de Justiça
do Estado do Espírito Santo (TJES). TJES Segue Reduzindo Despesas Com
Pessoal do Poder Judiciário Estadual, 12 jul. 2017. Disponível em:
<https://tinyurl.com/y9jabkwa>. Acesso em: 16 ago. 2017.
ESPÍRITO SANTO (Estado). Lei
nº 7.854, de 23 de setembro de 2004.
ESPÍRITO SANTO (Estado). Lei
nº 10.278, de 06 de outubro de 2014.
ESPÍRITO SANTO (Estado). Lei
nº 10.470, de 18 de dezembro de 2015.
TJ-ES É O ÚNICO do país a
extrapolar Lei de Responsabilidade Fiscal. G1, 20 dez. 2016. Disponível
em: <https://tinyurl.com/y7cxofqr>. Acesso em: 16 ago. 2017.
TJES RECONHECE direito à
promoção de servidores, mas flexibiliza data de pagamento. Século Diário.
Disponível em: <https://tinyurl.com/yczpr55j>. Acesso em: 16 ago. 2017.
TJES VOLTA a cumprir Lei de
Responsabilidade Fiscal. Gazeta Online, 11 mai. 2017. Disponível em:
<https://tinyurl.com/y75nvk2n>. Acesso em: 16 ago. 2017.